(fonte da IMAGEM: Pinterest)
(texto em construção)
Ainda na esteira das reflexões “de si para si”, que é o que realmente
importa, faço mais um registro entre os que se somam e serão reunidos,
oportunamente. Para uso futuro. Afastarmo-nos da Lei, dando crédito a falsos
juízos, isso é o que nos faz infelizes.
O filósofo estoico Epicteto propõe, como
tenho percebido nas meditações por aqui, como um primeiro passo o afastamento
dos falsos juízos. A proposta de Epicteto está bem próxima da que tinha sido
apresentada por Sócrates. Uma "vida examinada" e orientada por filosofia, como para
Sócrates, também para Epicteto faria com que compreendêssemos essa Lei e nos
tiraria da ignorância, além disso, nos colocaria na esteira de dois princípios
estoicos fundamentais que devem já formar a base sólida para enfrentar-se.
A saber:
A saber:
- a tranquilidade (apatheia),
- a imperturbável paz de espírito (ataraxia).
Destaco, como
tenho feito aqui, em outros escritos, nesse blog, algumas dicas de Epicteto. Antes,
porém, faço breve menção a um texto de Agostinho de Hipona, bem próximo da
reflexão que inicio e, em seguida acrescento ainda, outras citações para reflexão matinal, num esforço meramente pessoal de, na tentativa de
afastar-me dos falsos juízos, tomando tal embate como exercícios na aplicação
dos Theoremata (Encheridion, 51).
Lemos em Agostinho que:
"Os homens saem para fazer passeios, a fim
de admirar o alto dos montes, o ruído incessante dos mares, o belo e
ininterrupto curso dos rios, os majestosos movimentos dos astros. E, no
entanto, passam ao largo de si mesmos. Não se arriscam na aventura de um
passeio interior”.
Enquanto Marco Aurélio,
nos dizia, nas suas Meditações “de si
para si”:
3. Os homens procuram retiros, campos, praias, montanhas; também tu te
habituaste a desejar com ardor tais asilos. Mas é coisa insensata — porque, a
qualquer hora, podes retirar-te em ti mesmo. Com efeito, retiro algum é tão
repousante para o homem como o que encontra na própria alma, sobretudo se nela
encerra essas verdades que, apenas aprofundadas, nos conferem quietação
absoluta; e, dizendo “quietação”, entendo equilíbrio perfeito da alma. Oferece,
pois, a ti mesmo constantemente esse retiro e renova-te aí. Nele deves
encontrar as máximas breves e fundamentais que, apenas achadas, bastarão para
afugentar da tua alma todas as lutas e para te devolver, isento de amargura, à
vida onde de novo vais entrar. Porque, afinal, o que provocou a tua amargura? A
maldade humana? Medita estas verdades: os seres racionais nasceram uns para os
outros; suportarmo-nos mutuamente é uma parte da justiça; os erros são
involuntários e todos os que outrora brigaram, desconfiaram uns dos outros, se
odiaram, se disputaram, foram vencidos pela morte, que os reduziu a cinzas.
Deixa, pois, de sofrer por tais motivos.
Será
contra o teu destino, marcado pela natureza universal, que tens amargura?
Repete a ti mesmo este dilema: ou uma Providência ou átomos apenas, e tantas
provas de que o mundo é semelhante a uma cidade. As sensações corpóreas têm
ainda influência sobre ti? Lembra-te de que o pensamento não participa dos
movimentos suaves ou rudes da respiração desde que tomou posse de si mesmo e
reconheceu a própria essência; e lembra-te igualmente de todos os ensinamentos
que ouviste e aceitaste relativos à dor e ao prazer. — É a gloríola que te
agita? Considera o esquecimento rápido de tudo, o abismo de tempo que se
estende para trás e para diante de ti, a vaidade desse ruído em volta do teu
nome, a inconstância e a incompetência dos que parecem elogiar-te e a
exiguidade do espaço em que a tua fama se encerra: porque a Terra inteira é um
ponto apenas — e que parcela ínfima o pequeno canto que habitamos e, aí,
quantos homens (e que homens) te hão de louvar!
Resta-te,
pois, o retiro que te oferece a tua alma. E, sobretudo, não te oponhas: mas sê
livre e encara as coisas como criatura viril, humana, como um cidadão e um
mortal. E, entre os teus pensamentos habituais, coloca estas duas verdades:
primeiro, que as coisas não tocam na alma, mas ficam imóveis e fora dela, e que
as perturbações da alma nascem apenas da opinião interior que nela se forma
sobre as coisas; — segundo, que todos os objetos que vês serão em breve
transformados e deixarão de existir; pensa constantemente nas inúmeras
transformações a que já assististe: o mundo é uma contínua mudança e a vida,
apenas opinião.
Portanto, o que nos fará realmente
Bem é buscarmos o retiro que ofereça tranquilidade (apatheia) e imperturbável paz de espírito (ataraxia).
Para isso:
“12. É preciso que estejas prevenido sempre
para estas duas coisas: primeiro,
fazer unicamente o que te inspirar a tua faculdade soberana e legisladora para
o bem comum; segundo, mudar de
procedimento se alguém te corrigir de um erro e te fizer renunciar a uma
opinião, sendo porém necessário que essa mudança proceda sempre de um motivo
decisivo — por exemplo, de justiça ou de interesse geral e outras coisas
análogas, e nunca da esperança em prazeres ou glórias.
13. Possues a razão? — Sim. — Então por que não
te serves dela? Se é o que deve ser, que mais queres?
Bem próximo do que também disse Musônio Rufus:
"Devemos
viver como médicos, tratando a nós mesmos com a razão, contra os males de não
usá-la.”
Encerro com uma última citação de Marco Aurélio:
17. Não vivas como se devesses viver milhares
de anos. Pende sobre ti o inevitável: enquanto vives, enquanto podes, torna-te
homem de bem.”
______.
AGOSTINHO de HIPONA (354
- 430). "Confissões".
Livro X...
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