segunda-feira, 16 de janeiro de 2023

REFLEXÃO MATINAL CLII: EXERCÍCIOS PARA A MANHÃ E NOITE

 

(IMAGEM: "Pinterest")

Um exercício útil

Manhã

Nas Meditações (Livro V : 1), Marco Aurélio, anotava suas reflexões estóicas, e é notória proximidade com Epictetus e Sêneca.

De manhã, quando te levantas contra vontade, pensas: Levanto-me para cumprir a minha tarefa de homem. Por que hei de afligir-me, visto que vou fazer justamente aquilo para que nasci e para o que fui mandado a este mundo? Fui porventura criado para me conservar no quente, deitado debaixo de cobertores? — É mais agradável. — Nasceste, pois, para te entregares ao que é mais agradável? Em suma, nasceste para a passividade ou para a ação? Repara como plantas, pássaros, formigas, abelhas fazem cada qual o seu trabalho e concorrem quanto podem para manter o equilíbrio do mundo. Só tu estarias dispensado da tua tarefa e terias o direito de te furtar ao que manda a natureza? — Também devemos descansar. — É justo; mas ao repouso também a natureza impõe um limite, como ao comer e ao beber; e tu ultrapassas tal limite, vais além do que é necessário, enquanto na ação, no esforço, te conservas aquém do possível.”

Noite

“Todas as noites, pego emprestado dos Anciãos uma técnica cujos três passos constituem para mim a melhor maneira de manter um diário; Acho eficaz para encerrar o dia e planejar o próximo [...].

Todas as noites, sento-me em um lugar tranquilo para revisar meu progresso e me faço três perguntas simples, que podem ser formuladas da seguinte forma:

  1. Hoje, quais foram minhas boas ações? (Eu reflito sobre meu progresso pessoal, realização de meus principais objetivos e como me comportei com os outros.)
  2. Onde foi que eu errei? (Penso nos lapsos, nas falsas promessas que fiz ou nas pessoas que negligenciei.)
  3. Como posso melhorar amanhã? (Pensando nos outros, em minhas metas para o dia e corrigindo erros do passado.)

Pessoalmente, este exercício noturno permitiu-me acompanhar o meu progresso, responsabilizar-me pelos meus atos e, espero, agir melhor com o meu próximo. Por que não tentar ?”

...

Uma reflexão, entre as que acho belíssimas e costumo associar com a que segue abaixo, em que se lê os preceitos seguintes:


“Não deixe teu sono cair sobre seus olhos lassos

Antes de ter pesado todos os atos do dia:

Em que falhei? Que fiz, qual dever omiti?

Começa por aí e prossegue o exame: após o que 

Condena o malfeito, alegra-te pelo Bem.” [1]

...

Antes de ir para a cama, portanto:

Reflita sobre as coisas mais importantes que aconteceram no dia que encerrou e o que de mais importante relaciona-se com uma ética pessoal.

Pergunte a ti mesmo:

  1. O que fiz errado?
  2. O que fiz certo?
  3. E o que ainda precisa ser feito?

...

Acrescento ainda, nessa mesma perspectiva, numa outra abordagem para uma “visão de mundo” (Weltanschauung), temos as seguintes questões:

“Qual o meio prático mais eficaz que tem o homem de se melhorar nesta vida e de resistir à atração do mal?[2]

“Um sábio da Antiguidade vo-lo disse: Conhece-te a ti mesmo.”

a) - Conhecemos toda a sabedoria desta máxima; porém a dificuldade está precisamente em cada um conhecer-se a si mesmo. Qual o meio de consegui-lo?

Fazei o que eu fazia quando vivi na Terra: ao fim do dia, interrogava a minha consciência, passava revista ao que fizera e perguntava a mim mesmo se não faltara a algum dever, se ninguém tivera motivo para de mim se queixar. Foi assim que cheguei a me conhecer e a ver o que em mim precisava de reforma. Aquele que, todas as noites, evocasse todas as ações que praticou durante o dia e inquirisse de si mesmo o bem ou o mal que fez, rogando a Deus e ao seu anjo guardião que o esclarecessem, grande força adquiriria para se aperfeiçoar, porque, crede-me, Deus o assistiria. Dirigi, pois, a vós mesmos perguntas, interrogai-vos sobre o que tendes feito e com que objetivo procedestes em tal ou tal circunstância, sobre se fizestes alguma coisa que, feita por outrem, censuraríeis, sobre se obrastes alguma ação que não ousaríeis confessar. Perguntai ainda mais: “Se aprouvesse a Deus chamar-me neste momento, teria que temer o olhar de alguém, ao entrar de novo no mundo dos Espíritos, onde nada pode ser ocultado?” Examinai o que pudestes ter obrado contra Deus, depois contra o vosso próximo e, finalmente, contra vós mesmos. As respostas vos darão, ou o descanso para a vossa consciência, ou a indicação de um mal que precise ser curado.

“O conhecimento de si mesmo é, portanto, a chave do progresso individual. Mas, direis, como há de alguém julgar-se a si mesmo? Não está aí a ilusão do amor-próprio para atenuar as faltas e torná-las desculpáveis? O avarento se considera apenas econômico e previdente; o orgulhoso julga que em si só há dignidade. Isto é muito real, mas tendes um meio de verificação que não pode iludir-vos. Quando estiverdes indecisos sobre o valor de uma de vossas ações, inquiri como a qualificaríeis, se praticada por outra pessoa. Se a censurais noutrem, não a podereis ter por legítima quando fordes o seu autor, pois que Deus não usa de duas medidas na aplicação de Sua justiça. Procurai também saber o que dela pensam os vossos semelhantes e não desprezeis a opinião dos vossos inimigos, porquanto esses, nenhum interesse têm em mascarar a verdade, e Deus muitas vezes os coloca ao vosso lado como um espelho, a fim de que sejais advertidos com mais franqueza do que o faria um amigo. Perscrute, conseguintemente, a sua consciência aquele que se sinta possuído do desejo sério de melhorar-se, a fim de extirpar de si os maus pendores, como do seu jardim arranca as ervas daninhas. Faça o balanço de seu dia moral, como o comerciante faz o de suas perdas e seus lucros; e eu vos asseguro que a primeira operação será mais proveitosa do que a segunda. Se puder dizer que foi bom o seu dia, poderá dormir em paz e aguardar sem receio o despertar na outra vida.

“Formulai, pois, de vós para convosco, questões nítidas e precisas e não temais multiplicá-las. Justo é que se gastem alguns minutos para conquistar uma felicidade eterna. Não trabalhais todos os dias com o fito de juntar haveres que vos garantam repouso na velhice? Não constitui esse repouso o objeto de todos os vossos desejos, o fim que vos faz suportar fadigas e privações temporárias? Ora, que é esse descanso de alguns dias, turbado sempre pelas enfermidades do corpo, em comparação com o que espera o homem de bem? Não valerá este outro a pena de alguns esforços? Sei haver muitos que dizem ser positivo o presente e incerto o futuro. Ora, esta exatamente a ideia que estamos encarregados de eliminar do vosso íntimo, visto desejarmos fazer que compreendais esse futuro, de modo a não restar nenhuma dúvida em vossa alma. Por isso foi que primeiro chamamos a vossa atenção por meio de fenômenos capazes de ferir-vos os sentidos e que agora vos damos instruções, que cada um de vós se acha encarregado de espalhar. Com este objetivo é que ditamos O Livro dos Espíritos.

______.

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[1] PORFÍRIO. Vida de Pitágoras, § 40; Conversações III, 10. 3 (tradução Souilhé).

[2] KARDEC, A. Le Livre des Esprits. 2013. (Q.919-919a)

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