Após a “reflexão matinal”, estudando, tentando escrever e revisando o texto para submissão sobre uma pesquisa, reli os trechos abaixo.
De todas as leituras recentes sempre, em certa medida, tenho notado um renovado convite a estar atento ao que realmente está ao nosso alcance e o que não é de nossa alçada, separando pacientemente uma coisa da outra para continuar o caminho nas correções. Convite sempre reiterado, principalmente, na linha de interpretação do que escrevemos aqui, neste texto e outros. Ora, cabendo sempre observar que a prática visada concernente à filosofia moral aqui, numa perspectiva "estoica" ou "kantiana", amparadas em outras referências clássicas na filosofia, preservar a motivação na busca individual pela Virtude e "cura das paixões" (no LE 907-912: controle ou "vencer as suas más inclinações").
Aliás, este tema "paixões" que tem sido frequente aqui nesta página, também aparece na obra citada abaixo "Antropologia de um ponto de vista pragmático" e vou escrever algo mais sobre isso, em breve. Inclusive, tentando relacionar as fontes consultadas com frequencia.
Aqui, faço um esboço sobre temas e problemas da filosofia clássica alemã, focado em questõess antropológicas no pensamento clássico alemão, especificamente sobre o tema na Antropologia de Kant: “O caráter da espécie”, "a destinação do ser humanos" e a "faculdade de conhecer" (Kant. 2006, p. 215-227) entre outro temas na obra relacionados esses citados.
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Sobre a obra:
“Este inverno, pela segunda vez, estou oferecendo um curso em antropologia, o qual pretendo transformar em uma disciplina acadêmica própria... Meu intuito é expor através dela as fontes de todas as ciências, ciências da moral, ou habilidade, do convívio social, dos métodos de educar e governar seres humanos, e assim, de tudo o que pertence ao prático... Incluo muitas observações da vida comum, de forma que, meus leitores terão muitas oportunidades para comparar sua própria experiência com as minhas considerações e assim, do início ao fim, achar as aulas divertidas e nunca áridas. Em meu tempo livre, estou trabalhando em um exercício preparatório para alunos a partir desse (na minha opinião) muito prazeroso estudo empírico (Beobachtungslehre) da habilidade, prudência, e até sabedoria que, junto com a geografia física e diferente de toda outra instrução, pode ser chamado de conhecimento do mundo.”
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“Kant - (Carta a Marcus Herz, em 1773)
No caso de um livro que o próprio autor desejou que fosse “popular” talvez não seja supérfluo lembrar que a filosofia de Kant, por ser crítica, pretende estabelecer limites bem definidos para o conhecimento teórico, com a finalidade de assegurar à ciência a certeza e a objetividade que só podem ser alcançadas por via de regras e procedimentos formais sistematicamente construídos. E importante perceber corretamente o significa desses limites: não se trata de restringir os horizontes humanos nem de renunciar à experiência das possibilidades de conhecer e agir. Um iluminista que se dedica ao exame da razão só pode ter como meta a expansão de seu poder por via do conhecimento aprofundado da sua natureza. Se para ampliar aprimorar é preciso por vezes limitar e disciplinar, isso é algo que decorre de uma dialética interna à condição humana e de uma visão lúcida da finitude. Tenha-se presente, portanto, o caráter positivo dessa tarefa, inteiramente coerente com a perspectiva do progresso da humanidade no uso da razão.
O “ponto de vista pragmático” que Kant adota na sua Antropologia deriva desse humanismo progressista: a cultura e a educação do gênero humano só fazem sentido se servirem ao aprimoramento de cada homem, e este é o significado profundo da vinculação do saber antropológico ao mundo humano. Não se trata de utilitarismo e sim de uma concepção profunda de que o homem é, para si mesmo, finalidade e não instrumento. É isso que constitui a autenticidade de um conhecimento “pragmático”, que confere ao homem a prerrogativa de conhecer e dominar o mundo para servir aos fins humanos. Por isso o conhecimento das condições em que o homem elabora a sua própria existência não deve ser a mera descrição de mecanismos e habilidades inatos ou adquiridos, mas a avaliação do proveito que a espécie pode tirar daí para o aprimoramento de si mesma. A antropologia deve ser pragmática porque ela é inseparável do interesse do homem por si próprio e do compromisso que deve manter consigo mesmo.
É este o motivo pelo qual esse conhecimento não pode ser apenas teórico, isto é, não deve sujeitar-se aos limites da estrita objetividade, não porque desdenhe o rigor, mas porque o que está em jogo nesse caso justifica e mesmo exige um mais amplo descortino. A espécie de rigor que aí deve ser praticado conjuga-se com a ousadia de um desvelamento profundo na prática da observação. Hábitos contraídos e atitudes convencionadas devem ser superados quando o homem deseja verdadeiramente “estudar a si mesmo”. Dados de ordem científica devem ser justapostos às imagens construídas na literatura e nas artes, consideradas como fonte de apreensão dos caracteres humanos. Singularidades raciais e culturais devem ser comparadas, para ressaltar o sentido da diversidade. A antropologia, respeitando os limites da crítica do conhecimento, ao mesmo tempo se abre à totalidade.
É esta mescla de ambição e desprendimento ― algo que talvez esteja no cerne da atitude filosófica ― que faz da Antropologia de Kant uma lição para a nossa atualidade. (Franklin Leopoldo e Silva).
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Fonte: Amazon.com.br
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