quinta-feira, 28 de setembro de 2017

ESSÊNCIA E EXISTÊNCIA: UMA REFLEXÃO

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MARQUINHOS

Recolhe-te a estas coisas mais tranquilas, mais seguras, melhores! [...] elevar-se às coisas sagradas e sublimes para conhecer qual é a substância de deus, seu prazer, sua condição, sua forma, que destino guarda a tua alma, que lugar a Natureza nos destina após nos separarmos do corpo [...].” (SÊNECA. Sobre a brevidade da vida, XIX, 1).

Tenho estudado bastante e publicado aqui, alguns temas de teor filosófico diverso, nos quais me exercito. São diversos entre si, mas preservam uma linha tênue de relação: “ética”, “bioética”, “filosofia da religião”, o “problema mente-corpo” e o “estoicismo”. Na verdade, publico-os aqui somente para manter salvos os textos e retomá-los num futuro com fins de correção e sistematização.

Um dia desses, no entanto, sem sair da temática apontada e que tem sido constante, publiquei aqui uma frase, como tenho feito, exercitando como já disse, a redação. Ainda que fosse só um exercício despretensioso na direção do aperfeiçoamento da escrita, a frase, bem curta e sem muito "ineditismo" reforçava uma postura contrária que mantenho e quem me conhece sabe do que digo. A frase, a que me refiro e sustento serenamente, não com argumentos complexos, que aliás me agradam, mas por mera posição pessoal foi essa: "A essência não só precede à existência como ainda sobreviverá a ela." (MARQUINHOS, 2017)

A ela acrescento uma frase de Epictetus e avanço numa breve reflexão:

"Proteja o bem que existe em você em tudo o que você fizer, e no que diz respeito a todo o resto, receba o que lhe for dado enquanto puder fazer uso sensato. Se não puder, não terá sorte, estará propenso a falhar, perturbado e limitado." (Epictetus)

Para a típica forma de pensar e filosofar dos estoicos haveria, em nós, algo que se preserva em certa medida na execução do pensamento lógico universal, e dessa forma estaria garantida uma coerência e um equilíbrio que auxiliariam na tarefa de cada ser humano no exercício prático e constante de tornar-se a cada dia uma pessoa melhor; uma boa pessoa que segundo o que diz Epictetus, por haver uma essência esta deve ser preservada em nós como uma centelha interior que não pode se extinguir.

As nossas ações, no entanto, devem ser pensadas e direcionadas de certa forma ao bem comum sob pena de ela, para nós perder força e nos enfraquecer nos juízos que nos sejam pedidos acerca de decisões e sobre uma ou outra necessidade de tomar como certo ou verdadeiros atos do nosso cotidiano. Não havendo tal possibilidade de se estabelecer limites, haveria sim se os que, ultrapassando essas barreiras avançassem na ação que prejudicasse a outrem ou a si mesmos. Enfim, Epictetus, recomenda que não percamos essa nossa essência; que façamos o que é certo, o nosso dever.

E, também o imperador e filósofo Marco Aurélio teria escrito em suas Meditações: “Se não é certo, não faça. Se não é verdade, não diga”.
Interessa ressaltar aqui que mesmo sendo um imperador ele fazia esse tipo de ponderação; preservando-se distante dos comuns dos homens de seu tempo e assegurando a proteção da sua essência, similar ao pensamento de Epictetus, ressalte-se; nunca agindo sem estar certo nem faltando com a verdade.

É certo que ao ler este brevíssimo texto, alguém irá esbravejar sobre a questão da liberdade e da possibilidade de podermos fazer o que quisermos das nossas ações e vivermos cada um a sua própria vida do jeito e forma que achar melhor. O problema é atingirmos ou prejudicarmos alguém. Também alertando para o fato de que ao preservarmos aquela essência estaremos mantendo a nossa própria individualidade de forma que não se apague. Reafirma Marco Aurélio: "Meu único medo é fazer algo contrário à natureza humana ;  a coisa errada, do jeito errado, ou no momento errado." (Meditações. 7.20)

Uma reflexão que, com certeza, vou retomar, corrigir e aprofundar.
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SUGESTÕES DE LEITURA.

Entre as que tenho usado para melhor refletir e tentar fundamentar minhas leituras.

1. AQUINO, Tomas. O ente e a essência. Petrópolis- RJ: Editora Vozes, 2013.

“Marco entre as várias obras do autor, o livro adota posições que decidem, em grande parte, o destino do pensamento ao qual dá forma - o ente, o ser, a substância em suas divisões e em sua individuação, o acidente e as relações de tudo isto com as intenções lógicas. Uma obra de juventude, decisiva na medida em que torna transparente as diretrizes gerais da metafísica.”

2. GILSON, Étienne.  O ser e a essência. São Paulo: Editora Paulus, 2016.

“Foi com a publicação de O ser e a essência (1948) que Gilson verdadeiramente irrompeu no debate filosófico contemporâneo, constrangendo muitos [...] a admitir que esta pequena palavra, ser , que certa tradição idealista havia tentado inutilmente banir do vocabulário filosófico, abrigava, talvez, se não o destino do Ocidente , ao menos o lugar de uma de suas mais antigas e constantes querelas. Muitos se convenceram, ao ler Gilson, de que São Tomás teria ocupado nesse debate um lugar no mínimo original e importante, o qual não poderia mais ser ignorado, ainda mais – e sobretudo – ao se querer tomar partido na polêmica que então o existencialismo conduzia contra o suposto essencialismo de toda a tradição. Em suma, independentemente de suas virtudes próprias, este livro, desta vez reconhecido imediatamente como um livro de um filósofo, ainda que também seja um livro de historiador, teve, ao mesmo tempo, o mérito e a sorte de vir em boa hora, de responder à expectativa difusa de um público filosófico que acabava de descobrir, [...] a importância e – poder-se-ia dizer – a atualidade persistente da questão- o que é o ser?”

3. HADOT, Pierre. A filosofia como maneira de viver: entrevistas de Jeannie Carlier e Arnold I. Davidson. (Trad. Lara Christina de Malimpensa). São Paulo: É Realizações, 2016.

“Em uma série de entrevistas com Arnold I. Davidson e Jeannie Carlier, Pierre Hadot revela as chaves de seu itinerário de vida e de seu pensamento filosófico. Com base em suas reflexões sobre a filosofia antiga, Hadot descobre uma maneira de filosofar segundo a qual fazer filosofia não consiste em resolver problemas abstratos, mas em melhorar nossa forma de viver. O gênero da entrevista permite ao leitor penetrar de forma amena no pensamento de Hadot."

4. ______. Exercícios espirituais e filosofia antiga. Trad. Flavio Fontenelle Loque e Loraine Oliveira. Prefácio de Davidson, Arnold. São Paulo: É Realizações, 2014.

“Nos ensaios reunidos neste volume, o filósofo e historiador da filosofia Pierre Hadot traça o panorama histórico da noção de “exercício espiritual” e traz novamente à cena filosófica o debate acerca do estatuto da filosofia e da figura do filósofo. Com ele, voltamos a pensar o quanto a filosofia deixou de ser uma “atividade”, uma prática, para se tornar, cada vez mais, um “discurso”. Hadot propõe, ao contrário, um resgate da filosofia como “maneira de viver”.

5. RICOUER, Paul. Ser, essência e substância em Platão e Aristóteles. São Paulo: Martins Fontes, 2014.

“Este Curso interpreta com rigor o sentido das três palavras do título - 'ser', 'essência' e 'substância' - os conceitos fundamentais da metafísica ocidental. Como Platão e depois Aristóteles pensam tais conceitos? Que sentido lhes dão? Juntamente com o interesse intrínseco do comentário, muito profundo e muito apoiado nos textos, destacam-se as conexões e inversões que Ricceur estabelece dentro das duas filosofias e entre elas. Ele também põe em relevo evoluções surpreendentes - um segundo Platão criticou um primeiro Platão (o das Ideias) e um segundo Aristóteles criticou Platão, simplificando-o e mesmo caricaturando-o.”



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