sexta-feira, 2 de agosto de 2019

REFLEXÃO MATINAL XLVI: CAMINHAR POR ONDE O VAZIO NÃO PREDOMINA

A imagem pode conter: pessoas sentadas, árvore, grama, planta, sapatos, atividades ao ar livre e natureza

[…] No fundo, não creio que importa ser feliz no sentido em que as pessoas esperam ser felizes. Mas consigo entender plenamente essa felicidade árdua que consiste em despertarmos forças com um trabalho resoluto, as quais começam a trabalhar, elas mesmas, em nós." (RILKE, 2007)

Num tão crucial momento da vida damo-nos conta de que o que realmente agrada as multidões são discursos absurdos. E, por não nos alinharmos optamos por razoabilidades; o primeiro passo: o silêncio; o segundo: aplicar-se na busca de si mesmo, corrigir-se, aperfeiçoar-se e seguir em frente; e bem à frente, onde está o ponto de chegada, não circunscrito a limitadas fronteiras ou vagos pontos de vista.

Lendo um texto de Eça de Queirós, que ele chamou de "Máximo de tédio no máximo de civilização identifico várias passagens com as quais concordo e ainda servem para os dias atuais:

"Na Terra tudo vive - e só o homem sente a dor e a desilusão da vida. E tanto mais as sente, quanto mais alarga e acumula a obra dessa inteligência que o torna homem, e que o separa da restante Natureza, impensante e inerte. É no máximo de civilização que ele experimenta o máximo de tédio. A sapiência, portanto, está em recuar até esse honesto mínimo de civilização, que consiste em ter um tecto de colmo, uma leira de terra e o grão para nela semear. 

Em resumo, para reaver a felicidade, é necessário regressar ao Paraíso - e ficar lá, quieto, na sua folha de vinha, inteiramente desguarnecido de civilização, contemplando o anho aos saltos entre o tomilho, e sem procurar, nem com o desejo, a árvore funesta da Ciência! Dixit! "  (In: "Civilização", 1902)

E, por outro lado, o recurso do "regresso"... pensando para prosseguir, levou-me, como de costume, a Sócrates e a verdadeiros filósofos.

No Fédon, por exemplo, Sócrates expõe a Símias porque se deve estar atento e priorizar, nesta vida, a virtude (ἀξεηῆο) e a prudência (θξνλήζεσο): diz ele que a recompensa é bela (θαιὸλ γὰξ ηὸ ἆζινλ), e é grande a esperança (ἡ ἐιπὶο κεγάιε)! (Fédon, 114c). Pois...


“Os homens que de alguma forma, cuidam de sua alma (κέιεη ηῆο ἑαπηῶλ ςπρῆο) e não vivem com o pensamento fito no corpo (ζώκαηη πιάηηνληεο δῶζη), quando dizem adeus a todo este tipo de prazeres (εἰδόζηλ) é para seguir um trilho bem diverso daqueles que não sabem aonde vão dar: pois, convictos como estão de que nada devem fazer, que seja contrário à filosofia (θηινζνθίᾳ πξάηηεηλ) e à libertação purificadora (ηῇ ἐθείλεο ιύζεη) que neles opera, é na sua direção que se voltam, seguindo espontaneamente na via por onde ela os conduz (ὑθεγεῖηαη) – (Fédon, 82d).” 

Bastante conhecido que Sócrates caminhou pelas ruas de Atenas tentando persuadir outros cidadãos e até mesmo estrangeiros de que o fundamental é sempre o esforço em se melhorarem as almas. Pois, para ele, a alma é a parte mais preciosa (ηηκηώηεξνλ) – (Críton, 48a); tinha como principal objetivo defender a importância da alma e que esta, vale mais do que o corpo. Fica evidente que a busca da virtude, para Sócrates, está amplamente relacionada com a felicidade. Alcançar virtude é ser feliz.

(grifos meus)
______.
PLATÂO. Fédon. “Diálogos platônicos” 3. ed. Belém: EDUFPA, 2011. (edição bilíngue)

RILKE, Rainer Maria. “Cartas do Poeta sobre a vida". São Paulo: Martins Fontes - selo Martins, 2007.

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