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“[LII.1] O
primeiro e mais necessário tópico da filosofia é o da aplicação dos princípios,
por exemplo: “Não sustentar falsidades”. O segundo é o das demonstrações, por
exemplo: “Por que é preciso não sustentar falsidades?” O terceiro é o que é
próprio para confirmar e articular os anteriores, por exemplo: “Por que isso é
uma demonstração? O que é uma demonstração? O que é uma consequência? O que é
uma contradição? O que é o verdadeiro? O que é o falso?” [LII.2] Portanto, o terceiro
tópico é necessário em razão do segundo; e o segundo, em razão do primeiro –
mas o primeiro é o mais necessário e onde é preciso se demorar. Porém, fazemos
o contrário: pois no terceiro despendemos nosso tempo, e todo o nosso esforço é
em relação a ele, mas do primeiro descuidamos por completo. Eis aí porque, por
um lado, sustentamos falsidades e, por outro, temos à mão como se demonstra que
não é apropriado sustentar falsidades.[1]”
Os chamados “exercícios”, propostos por Hadot (2001), estão ligados ao que encontramos, em certa medida, com
cuidado, na obra dos estoicos e de Epicteto: “exercício da consciência de si", como um “exercício da atenção” a si mesmo. Em “Diatribes. Livro IV. XII), o
capítulo inteiro é sobre a atenção (prosoché- περί προσοχῆς).
Neste sentido, nossa “reflexão matinal”
foi sobre a prosoché: uma “prática que silencia o ruído que existe
dentro de nós”[2].
Tantas "coisas podem nos distrair"[3].
Não são poucas as vezes em que nos deixamos arrastar pelo que já aconteceu
num remoto passado. Prendemos-nos às "velhas
memórias e experiências"[4].
Quanto ao futuro, pode-se dizer o mesmo, a ansiedade que nos causa projetarmos
daqui para lá.
Se queremos, portanto, mudar isso,
devemos criar uma nova atmosfera interior. O primeiro passo é não começar,
jamais, tentando mudar o mundo ou as demais pessoas. Nossa prioridade deve ser
encontrarmos um espaço de tranquilidade interior, aprendermos mais sobre nós
mesmos. Isso inclui tentar reconhecer e compreender limites e
imperfeições.
A atenção (prosoché) é o elemento para evitarmos
que a razão se desvie no caminho das representações brutas. Servirá, se o
indivíduo mantiver isso em mente, para ajudar a razão a reordená-las e
redirecioná-las para a autotransformação. E, principalmente nessa difícil
caminhada, na consecução da aplicação dos princípios básicos (Theoremata[5]).
______.
EPICTÉTE. Entretiens. Livre I, II, III, IV.
Trad. Joseph Souilhé. Paris: Les Belles Lettres, 1956.
______. Epictetus Discourses. Trad.
Dobbin. Oxford: Clarendon, 2008.
______. Testemunhos e Fragmentos. Trad.
Aldo Dinucci; Alfredo Julien. São Cristóvão: EdiUFS, 2008.
______. The Discourses of Epictetus as
reported by Arrian; fragments: Encheiridion. Trad. Oldfather.
Harvard: Loeb, 1928. https://www.loebclassics.com/
GAZOLLA,
Rachel. O ofício do filósofo
estóico: o duplo registro do discurso da Stoa, Loyola, São Paulo,
1999.
HADOT, Pierre. The inner citadel: the meditations
of Marcus Aurelius. London: Harvard University Press, 2001.
HANH, Thich Nhat. Meditação andando: guia para a paz
interior. 21. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.
[1] DINUCCI,
A.; JULIEN, A. O Encheiridion de Epicteto. Coimbra: Imprensa de Coimbra, 2012.
[2]
HANH, Thich Nhat. Silêncio: o poder da quietude em um
mundo barulhento. Rio de Janeiro, RJ: Harper Collins, 2018.
[3] Idem, Ibidem.
[4] Idem, Ibidem.
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