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“Todos nós fomos feitos pela natureza, de
forma que possamos viver livre de erros e de forma nobre, não que um possa e
outro não possa, todos podemos.” (Musônio Rufus)
Os estoicos adotam, como tenho
anotado aqui, a reflexão matinal,
como uma preparação para o dia que surge e que aplica-se ao dia que se inicia e
aos dias seguintes; por toda vida.
O prokopton, ao levantar-se
pela manhã, deverá ter sempre essa meta. E, também recomendam uma “meditação retrospectiva noturna” (que Agostinho de Hipona também recomendou).
O aspirante à sabedoria,
deverá ter sempre boas coisas em mente quando o dia começa; deve ocupar-se com
os “tà eph’hēmîn”, com os encargos que sejam verdadeiramente seu dever
pessoal .
Começa, toda manhã, ao
despertar, perguntando-se: o que, na verdade, deve ser o foco para
alcançar a Ἀταραξία - ataraxia "imperturbabilidade de espírito"?
Durante todo dia, todos
os dias, a meta deverá ser a disciplina interior, meta a que deve
dedicar o seu tempo, os que pretendem alcançar sabedoria.
É, nesse sentido,
portanto, em meio aos afazeres que se seguirão, pensando na reflexão
matinal, reli, há pouco, uma referência de Epicteto a um certo exercício, típico da escola dos
pitagóricos, em conformidade com o que Hadot chama de “exercícios espirituais”,
que também já registrei aqui, a partir da leitura de um artigo e de uma
apresentação do prof. Aldo Dinucci, num "Colóquio
sobre Epicteto", em que discute essa expressão, que deve entendida
como “O primeiro e mais necessário
tópico da filosofia: a "[...] aplicação
dos princípios [...]" (Encheirídion. 52:1).
Enfim, dito isso, só como
reflexão, acrescento, do Encherídion:
“Das coisas
existentes, algumas são encargos nossos1; outras não. São encargos nossos o
juízo, o impulso, o desejo, a repulsa – em suma: tudo quanto seja ação nossa.
Não são encargos nossos o corpo, as posses, a reputação, os cargos públicos –
em suma: tudo quanto não seja ação nossa.” (Encheirídion, 2012. I:1)
Nesse sentido, lendo pela manhã sobre o tema, num grande intervalo por aqui, encontrei algo bastante semelhante nessa passagem das "Paixões da alma", de René Descartes:
“Mas, como a maioria de
nossos desejos se estende a coisas que não dependem de nós nem todas de outrem,
devemos exatamente distinguir nelas o que depende apenas de nós, a fim de
estender nosso desejo tão-somente a isso; e quanto ao mais, embora devamos
considerar sua ocorrência inteiramente fatal e imutável, a fim de que nosso
desejo não se ocupe de modo algum com isso, não devemos deixar de considerar as
razões que levam mais ou menos a esperá-la, a fim de que essas razões sirvam
para regular nossas ações” (Paixões da alma, 1983. § 146)
Somadas, portanto, o que se pode extrair destas duas citações, fica bem clara a tarefa do Prokopton.
A se pensar!
______.
DESCARTES, René.
Discursos do Método; Meditações; Objeções e Respostas; As
Paixões da Alma; Cartas. (Introdução de Gilles-Gaston Granger; prefácio e
notas de Gerard Lebrun; Trad. de J. Guinsberg), Bento Prado Jr. 3. ed. São
Paulo: Abril Cultural, 1983 (Os Pensadores).
DINUCCI, A.; JULIEN, A. O Encheiridion
de Epicteto. Coimbra: Imprensa de Coimbra, 2014.
EPICTETO. Entretiens. Livre
I, II, III, IV. Trad. Joseph Souilhé. Paris: Les Belles Lettres, 1956.
______. Epictetus
Discourses. Book I. Trad. Dobbin. Oxford: Clarendon, 2008.
______. O
Encheirídion de Epicteto. Trad. Aldo Dinucci; Alfredo Julien. São
Cristóvão: EdiUFS, 2012. (Edição Bilíngue)
______. Testemunhos
e Fragmentos. Trad. Aldo Dinucci; Alfredo Julien. São Cristóvão: EdiUFS,
2008.
EPICTETUS. The Discourses
of Epictetus as reported by Arrian; fragments; Encheiridion. Trad.
Oldfather. Harvard: Loeb, 1928. https://www.loebclassics.com/
HADOT, Pierre. The
inner citadel: the meditations of Marcus Aurelius. London: Harvard
University Press, 2001.
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