domingo, 22 de maio de 2022

REFLEXÃO MATINAL CXXVII: DAS PAIXÕES DA ALMA À APATHEIA E ATARAXIA

(IMAGEM: "Pinterest")

Tomando o enunciado como uma das tarefas fundamentais e, com certeza, para alcançar 'Aταραξία - ataraxia. Como sempre digo quando são desse tipo, estão bem em consonância com os enunciados básicos que, como princípios, já adotamos aqui, pois:

"[...] se a razão prevalecer, as paixões nem sequer começarão; mas se elas se encaminharem contra a vontade da razão, elas se manterão contra a vontade da razão. Pois é mais fácil detê-las no começo do que controlá-las quando ganham força." (DESCARTES. Paixões da alma.)

Como tenho feito e deve ser feito, prossigo aqui com as reflexões, estabelecidas, para mim, por mim, já há algum tempo, em nível de aprendizagem constante, como projeto: a reforma de conduta pessoal, “curar as paixões”; domar o corcel desgovernado, exercitar-se sem rudeza, em abandonar um hábito.

Ou seja, todos os esforços para melhor compreensão do que seja desenvolver e aplicar a virtude, em aprimorar as emoções, exatamente por pressupor que tais podem ser revertidas. Ao contrário de concepções mirabolantes que dominam o "mercado", é possível e viável tal reversão, em força interior para resistir aos assaques e provocações externas, na constituição da imperturbável tranquilidade da alma (ataraxía - ἀταραξία).

Para isso, adotamos, manter livre o princípio diretor:

"Apaga a imaginação; acalma o impulso; extingue o desejo: domina a tua alma." (MARCO AURÉLIO. Meditações. IX,7)

E, leio e releio sempre também em René Descartes, na obra sobre “As paixões da alma”, ponto de partida da reflexão desta manhã:

"Ora, visto que essas emoções interiores nos tocam mais de perto e têm, por conseguinte, muito mais poder sobre nós do que as paixões que se encontram com elas, e das quais diferem, é certo que, contanto que a alma tenha sempre do que se contentar em seu íntimo, todas as perturbações que vêm de outras partes não dispõem de poder algum para prejudicá-la. Servem, antes, para lhe aumentar a alegria, pelo fato de, vendo que não pode ser por elas ofendido, conhecer com isso a sua própria perfeição. E, para que a nossa alma tenha assim do que estar contente, precisa apenas seguir estritamente a virtude. Pois quem quer que haja vivido de tal maneira que sua consciência não possa censurá-lo de alguma vez ter deixado de fazer todas as coisas que julgou serem as melhores (que é o que chamo aqui seguir a virtude), recebe daí uma satisfação tão poderosa para torná-lo feliz que os mais violentos esforços da paixão nunca têm poder suficiente para perturbar a tranqüilidade de sua alma".

Portanto, na busca pela vida tranquila e feliz, a proposta da filosofia estoica era de que os fatores externos que comprometessem a perfeição moral e intelectual devem ser ignorados, superados, tratados com apátheia (ἀπάθεια).

Mesmo nas dificuldades, a reação indicada ao ser humano, era sempre agir com muita calma e tranquilidade, sem que fatores externos perturbem nossa capacidade de julgar ou reagir.

Seguimos assim, então, numa tradição que Pierre Hadot chamou de “exercícios espirituais

. ' .

______.

ARRIANO FLÁVIO. O Encheirídion. Edição Bilíngue. Tradução do texto grego e notas Aldo Dinucci; Alfredo Julien. Textos e notas de Aldo Dinucci; Alfredo Julien. São Cristóvão. Universidade Federal de Sergipe, 2012).

CÍCERO, M.T. 1988. De finibus bonorum et malorum / Über die Ziele des menschlichen Handelns. Edição e tradução: Olof Gigon. München/Zürich: Ártemis.

DESCARTES, René.  Discursos do Método; Meditações; Objeções e Respostas; As Paixões da Alma; Cartas. (Introdução de Gilles-Gaston Granger; prefácio e notas de Gerard Lebrun; Trad. de J. Guinsberg), Bento Prado Jr. 3. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1983 (Os Pensadores).

DINUCCI, A.; JULIEN, A. O Encheiridion de Epicteto. Coimbra: Imprensa de Coimbra, 2014.

EPICTETO. Entretiens. Livre I, II, III, IV. Trad. Joseph Souilhé. Paris: Les Belles Lettres, 1956.

______. Epictetus Discourses. Book I. Trad. Dobbin. Oxford: Clarendon, 2008.

______. O Encheirídion de Epicteto. Trad. Aldo Dinucci; Alfredo Julien. São Cristóvão: EdiUFS, 2012. (Edição Bilíngue)

______. Testemunhos e Fragmentos. Trad. Aldo Dinucci; Alfredo Julien. São Cristóvão: EdiUFS, 2008.

KANT, Immanuel. Crítica da razão prática. Edição bilíngüe.Tradução Valerio Rohden. São Paulo: Martins Fontes. 2003.

_______.Crítica da razão pura. Tradução Valerio Rohden e Udo Moosburguer. Coleção OsPensadores. São Paulo,Abril Cultural, 1983.

______. A religião nos limites da simples razão. Edições 70, Lisboa, 1992.

_______. 1902 ss. Reflexionen zur MoralphilosophieIn: KANT, Immanuel. Kants Werke, Ed. Königlich Preussischen Akademie der Wissenschaften, Berlin, Georg Reimer, Akademie Text-Ausgabe, Berlin,Walter de Gruyter & Co.>, vol. XIX.

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_______. Crítica da faculdade do juízo. Trad.Valerio Rohden e António Marques, 1993.

KARDEC, A. Le Livre des Esprits. Paris, Dervy-Livres, s.d. (dépôt légal 1985).(O Livro dos Espíritos. Trad. Guillon Ribeiro, ______. O livro dos Espíritos. 93. ed. - 1. reimpressão (edição histórica). Brasília, DF: Feb, 2013. (Q. 907-912: "paixões"; 893-906: “virtudes e vícios”e 920-933: "felicidade")

LEBRUN, Gérard. O conceito de paixãoIn: NOVAES, Adauto (org.). Os sentidos da paixão. São Paulo: Cia. das Letras, 1987.

MARCO AURÉLIO. Meditações. São Paulo: Abril Cultural, 1973. (Livro II. 1).

SÊNECA, Lúcio Aneu. Cartas a Lucílio. 14. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gubekian, 2014 (Carta LXXX)

TEIXEIRA, L. Ensaio sobre a Moral de Descartes. 222p. Tese (Cátedra) – Faculdade de Filosofia Ciências e Letras. São Paulo, 1955.

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