Pensando bem!
Mais uma reflexão sobre a Vida Feliz (De Vita Beata)
DOIS CAMINHOS... UM A SEGUIR...
Enquanto
evito a “multidão”, cito Sêneca, para abrir a "reflexão
matinal" sobre um livro de Luc Ferry que estou lendo:
"Quando
se trata da felicidade, não é adequado que me respondas de acordo com o costume
da separação dos votos : 'A maioria está deste lado, então, do outro está a
parte pior'. Em se tratando de assuntos humanos, não é bom que as coisas
melhores agradem à maioria. A multidão é argumento negativo. Busquemos o
melhor, não o mais comum, aquilo que conceda uma felicidade eterna, não o que
aprova o vulgo, péssimo intérprete da verdade. Chamo vulgo tanto àqueles que
vestem a clâmide quanto aos que carregam coroas. Não olho a cor das roupas que
adornam os corpos, não confio nos olhos para conhecer o homem. Tenho um
instrumento melhor e mais confiável para discernir o verdadeiro do falso; o bem
do espírito, só o espírito o há de encontrar”. (Sêneca. In: "Vida
Feliz")
Reli,
há poucos dias, um livrinho: A Carta sobre a felicidade, de Epicuro
a Meneceu; em seguida retomei as Cartas de Sêneca a Lucílio, A
vida feliz, de Sêneca e hoje encerrando a leitura de um recente livro de
Luc Ferry sobre o tema. Aos anteriores, portanto, acrescentei esse do Luc Ferry:
A vida feliz: sabedorias antigas e espiritualidade laica. E, como sempre faço, adiciono aqui e em breve farei
uma retomada, inserida nos “exercícios espirituais” conforme anoto abaixo.
Sobre
Sêneca: em seu livro A vida feliz se opõe a Epicuro que
defende o prazer como a fonte da felicidade.
“Você
se dedica aos prazeres, eu os controlo; você se entrega ao prazer, eu o uso;
você pensa que é o bem maior, eu nem penso que seja bom: por prazer não faço
nada, você faz tudo.” (X, 3 ).
Cabendo
ressaltar que ‘Feliz’ na discussão entre estoicos e epicuristas, é o
equivalente da palavra grega eudaimonia (εὐδαιμονία),
que pode ser traduzida como “vida digna de ser vivida”, “vida boa”, “plenitude
do ser”.
Os
estoicos defendem que a única vida que vale a pena ser vivida é aquela de
retidão moral, o tipo de existência à qual olhamos no final e podemos dizer
honestamente que não nos envergonhamos; uma vida virtuosa.
Diz
Sêneca que não devemos ter a felicidade como objetivo: “não é fácil alcançar
a felicidade já que quanto mais avidamente um homem se esforça para alcançá-la
mais ele se afasta”.(I,1) a conclusão é que a solução é
ter como objetivo a virtude, a felicidade será consequência.
Ademais:
“Quem,
por outro lado, forma uma aliança, entre a virtude e o prazer, obstrui qualquer
força que uma possa possuir pela fraqueza da outra, e envia liberdade sob o
jugo, pois a liberdade só pode permanece inconquistável enquanto não sabe nada
mais valioso do que ela mesma: pois começa a precisar da ajuda da Fortuna, o
que é a mais completa escravidão: sua vida torna-se ansiosa, cheia de
suspeitas, tímida, temerosa de acidentes, esperando em agonia por momentos
críticos. Você não oferece à virtude uma base sólida e imóvel se você a colocar
sobre o que é instável: e o que pode ser tão instável quanto a dependência do
mero acaso e as vicissitudes do corpo e daquelas coisas que agem sobre o corpo?”. (XV,
3 )
Fica
claro, portanto, uma recomendação: a de que não devemos associar a virtude ao prazer,
pois se assim o fizermos acabaremos adentrando territórios não virtuosos, seduzidos pelo prazer
"desregrado".
Assim, seguindo essa
reflexão, acrescento como disse acima o Livro do Ferry que acabei de ler e citei
acima; motivo dessas anotações de hoje.
Vejamos, de início, o que
me chamou atenção nesse texto: principalmente a defesa de uma “espiritualidade
laica” fundamentada num “racionalismo crítico” que ele mesmo aponta como ter
sido influenciada por Immanuel Kant, Karl R. Popper, Alexis de Tocqueville e o “programa
de trabalho de Victor Hugo”
Enfim, terminando de ler esse livro hoje e destaco que,
“Neste livro, o filósofo
francês Luc Ferry nos brinda com uma investigação profunda e instigante sobre a
busca pela felicidade e por significado na vida. Ele nos conduz através das
correntes de pensamento filosófico e da espiritualidade laica, explorando o
legado da mitologia e sua relevância para os desafios contemporâneos.
Um texto que nos leva a
refletir sobre os princípios fundamentais da vida feliz, desafiando nossas
perspectivas e encorajando-nos a desvendar nossas próprias escolhas e
propósitos.”
“La vie heureuse - Luc Ferry
Présentation:
Des
scientifiques, de plus en plus nombreux, nous promettent que la « révolution de
la longévité » est pour demain, que nos petits-enfants pourront vivre cent
cinquante ans, voire davantage, encore jeunes et en bonne santé physique
et psychique. Ce livre fait le point sur ces recherches, sépare science et
fantasmes et pose la question de fond : à quoi bon vivre aussi longtemps ?
Face
à cette interrogation, deux conceptions de la vie heureuse s’opposent. La
première nous vient de ces sagesses anciennes que la psychologie positive remet
au goût du jour. Elles nous invitent à dire « oui au réel », à nous résigner à
l’ordre naturel des choses afin d’accepter dans la sérénité la vieillesse et la
mort. Les modernes philosophies de l’histoire et de la liberté plaident pour
une tout autre spiritualité : si une éducation tout au long de la vie, voire
une perfectibilité potentiellement infinie, sont le propre de l’Homme, allonger
la vie en bonne santé pourrait offrir à l’humanité l’occasion de devenir enfin
moins bornée, moins violente, et, pourquoi pas, plus sage qu’elle ne le fut au
xxe siècle.
Ce sont les termes de ce débat désormais crucial que présente ce livre. L.F.”
Prossigo!
(Grifos e destaques são meus)
______.
FERRY, Luc. La vie
heureuse: sagesses anciennes et spiritualité laïque. Paris: Editions L’Observatoire,
2022
______. A vida feliz:
sabedorias antigas e espiritualidade laica. Petrópolis, RJ: Vozes Nobilis, 2023.
Para saber mais sobre o
tema:
DINUCCI,
A.; JULIEN, A. O Encheiridion de Epicteto. Coimbra: Imprensa
de Coimbra, 2014.
EPICTETO. Entretiens. Livre
I, II, III, IV. Trad. Joseph Souilhé. Paris: Les Belles Lettres, 1956.
______. Epictetus
Discourses. Book I. Trad. Dobbin. Oxford: Clarendon, 2008.
______. O
Encheirídion de Epicteto. Trad. Aldo Dinucci; Alfredo Julien. São
Cristóvão: EdiUFS, 2012. (Edição Bilíngue)
______. Testemunhos
e Fragmentos. Trad. Aldo Dinucci; Alfredo Julien. São Cristóvão:
EdiUFS, 2008.
EPICTETUS. The
Discourses of Epictetus as reported by Arrian; Fragments; Encheiridion. Trad.
Oldfather. Harvard: Loeb, 1928.
EPICURO. Carta
sobre a felicidade: a Meneceu. São Paulo: Ed. Unesp, 1999.
ESPINOSA,
Maria José Hernández. Epicuro e Séneca: leyendo Carta a
Meneceo y La vida feliz. Publicacions de la Universitat de
València, 2009.
HADOT,
Pierre. The inner citadel: the meditations of Marcus Aurelius.
London: Harvard University Press, 2001.
HANH,
Thich Nhat. Meditação andando: guia para a paz interior. 21.
ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.
MAY,
Rollo. O homem à procura de si mesmo. São Paulo: Ed. Círculo
do livro, 1992.
KARDEC,
A. Le Livre des Esprits. Paris, Dervy-Livres, s.d. (dépôt
légal 1985). (O Livro dos Espíritos. Trad. Guillon Ribeiro,
______. O livro dos Espíritos. 93. ed. - 1. reimpressão (edição
histórica). Brasília, DF: Feb, 2013. (Q. 625; 907-912; 919-921 ).
LEBRUN,
Gérard. O conceito de paixão. In: NOVAES, Adauto
(org.). Os sentidos da paixão. São Paulo: Cia. das Letras,
1987.
MARCO
AURÉLIO. Meditações. São Paulo: Abril Cultural, 1973.
SÉNECA,
Lúcio Aneu. Cartas a Lucílio. 5. ed. Lisboa: Fundação Calouste
Gulbekian, 2014.
______. Da
tranquilidade da alma. (precedido de "Da vida retirada", seguido de "Da
felicidade". Porto Alegre, RS: L&PM, 2009.
______.
Vida Feliz. 2. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009.
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