A reflexão
vespertina de hoje; como de praxe, é mais um exercício fugindo da
trivialidade, que instaura o domínio da superficialidade, destrói o sentimento
de moderação
e da busca do necessário, antes visto como normalidade.
A prática comum, desse
modo, entre os estudos, tem sido a adoção sistemática, disciplinada, de exercícios
que propiciam um distanciamento das agruras do cotidiano no firme propósito de
buscar ou resgatar instantes de Paz.
Nas passagens de filosofia, citadas aqui, a repetida tentativa de refletir sobre
este esforço; esta busca constante pela moderação.
Pois que:
"A
natureza dá-nos em abundância o que naturalmente necessitamos. A civilização do
luxo é um desvio em relação à natureza: dia-a-dia cria novas necessidades, que
aumentam de época para época; o engenho está a serviço dos vícios”.
Onde está a moderação?
“Desapareceu
de entre nós a antiga moderação natural que limitava os desejos às
necessidades; hoje, desejar apenas o essencial é dar provas de mesquinho
provincianismo”
É então que a filosofia de Sêneca e dos estoicos, portanto, ganha aqui, para tal reflexão, o
sentido de medicamentum. Ou seja; um guia para
aprimoramento do caráter puramente humano.
A compreensão da natureza nos conduzirá à superação de temores e à compreensão
do homem e do que está para além das suas limitações.
Exercitemo-nos, na busca
pela moderação. A fuga do trivial.
A moderada normalidade é
meta por aqui.
E,
Como resultando das muitas "meditações matinais" que tenho feito, surgiu a lembrança de que os estoicos propunham também “meditações vespertinas” e “meditações noturnas”, como já escrevi aqui, outras vezes.
E, não é novidade que, em geral, a filosofia é vista como um exercício inútil, reservado a desocupados que vivem isolados em suas torres de marfim. A considerar-se que a filosofia tem mesmo uma característica bastante voltada à reflexão teórica, abre-se imenso campo para que a vejam como inaplicável, portanto, dispensável.
Mas, como outros estoicos, o filósofo
estoico Caio Musônio Rufo,
chamado por alguns de “Sócrates romano”, tornou-se à sua época conhecido
não só por sua coerência interna, ou seja, pela aproximação entre o que
ensinava e o que vivenciava mas por ter ensinado
outro grande estoico: Epicteto; sobre quem tenho dedicado alguns breves
textos aqui, no Blog.
Aqui, mais uma vez, vou destacar que
nas minhas leituras cada vez mais frequentes sobre estoicismo, que o mais notório princípio
para prática dessa filosofia é o conjunto de "exercícios
práticos". Ora, visto que os objetivos estoicos estão
sempre ajustados de forma a dar mais valor à ação do que às palavras, a maneira de agir de cada indivíduo
que pretenda ser um estoico é priorizada devido ao fato de que
verdadeiramente a ação mostra como uma pessoa realmente é. Daí
a incessante busca, realizando tais "exercícios práticos"
no cotidiano para alcançar o sempre almejado princípio da eustatheia (tranquilidade)
e desenvolver a euthymia (crença em si). E, como,
também, já anotei aqui nessa página, mais de uma vez, nunca é demais reforçar e refazer o
caminho no sentido de dar continuidade às reflexões pessoais, procurando
juntar teoria e prática, uma das maneiras estoicas
de se posicionar em oposição àqueles que julgam a filosofia como inútil. A
referência estoica é Sócrates.
Então, nesta meditação vespertina de
hoje, reflito e proponho:
“(a) As coisas não inquietam os homens,
mas as opiniões sobre as coisas. Por exemplo: a morte nada tem de terrível, ou
também a Sócrates teria se afigurado assim, mas é a opinião a respeito da
morte — de que ela é terrível — que é terrível! Então, quando se nos
apresentarem entraves, ou nos inquietarmos, ou nos afligirmos, jamais
consideraremos outra coisa a causa senão nós mesmos — isto é: as nossas
próprias opiniões.
(b) É ação de quem não se
educou acusar os outros pelas coisas que ele próprio faz erroneamente. De quem
começou a se educar, acusar a si próprio. De quem já se educou, não acusar os
outros nem a si próprio.”
Acrescento:
(c) Outra recomendação de Musônio Rufo valorizava a
"moderação", ou sōphrosúnē (σωφροσύνη - em
grego antigo). A sōphrosúnē consiste em abrandar suas emoções;
não comer demais, ser frugal e comportar-se com certo equilíbrio e gravitas.
A moderação está profundamente relacionada com estabelecimento de médias nas
atividades práticas pessoais. E, no que se refere especificamente às emoções, Musônio Rufo afirma, por exemplo,
que:
“Palavras de aconselhamento e
admoestação oferecidas quando as emoções de uma pessoa estão em seu ponto mais
alto e transbordante pouco ou nada adiantam. [Fragmento nº 36]”
Portanto, como um método para exercício dessas recomendações,
segue a indicação abaixo:
“O método a que Musônio Rufo se refere
pode ser a prática estoica da meditação retrospectiva noturna, a qual envolve a
reflexão sobre o que você fez de bom ou de ruim em cada dia e a imaginação
sobre o modo de melhorar sua conduta dali por diante.
À mesa do jantar ou à hora de dormir,
converse com seu filho sobre como foi o dia para vocês dois, discutindo o que
deu certo e o que deu errado. Vocês perderam alguma oportunidade de fazer algo
positivo pelo seu crescimento enquanto pessoas? Útil tanto para os filhos como
para os pais é refletir sobre sua própria conduta, fazer comentários sobre suas
falhas pessoais e revirar o cérebro em busca de soluções que visem ao
aprimoramento de si. Sabedoria não é algo que se adquira do dia para a noite:
estamos sempre nos empenhando na direção dela.”
O método de Musônio
Rufo apresentado acima como "meditação vespertina",
é uma proposta de reflexão sobre o que fizemos de bom ou ruim ao
longo de cada dia e o estabelecimento ou reforço de "metas" a serem
vencidas para a melhora da conduta a partir de cada novo dia que vai
terminando.
Isso já aparece nas atribuições
necessárias ao "προκόπτον –prokopton”, tanto na
"meditação retrospectiva noturna", quanto nas "reflexões
matinais"
Ademais, como fiz aqui, nunca é
dispensável reforçar e prosseguir nos termos expostos em que nos colocaremos
em uníssono o que dizemos e o que fazemos. Moderação e equilíbrio dos
polos.
(Grifos
e destaques meus)
______.
SUGESTÃO DE LEITURAS
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