sexta-feira, 11 de março de 2022

REFLEXÃO MATINAL CXXII: AINDA SOBRE A NATUREZA, O EXCESSO E A "CURA DAS PAIXÕES" (II)

 

(IMAGEM: "Pinterest")

"Quem és tu para me dar conselhos? Acaso já te aconselhaste a ti próprio, já corrigiste o teu carácter, para te poderes armar em director da consciência alheia? Objecção justa, a tua; eu, contudo, não sou tão descarado que, doente eu próprio, me aplique a dar remédio aos outros! É como companheiro de sanatório que eu falo contigo da nossa comum enfermidade e te dou parte dos medicamentos que uso. Escuta, portanto, as minhas palavras como se estivesses me ouvindo falar comigo mesmo; é como se eu te permitisse o acesso aos meus segredos e discutisse comigo mesmo na tua presença." (SÉNECA, 2014)

Mais uma vez, continuando as reflexões, estabelecidas já há algum tempo, como projeto na reforma da conduta pessoal para melhor compreensão do que seja desenvolver e aplicar a virtude.

Ainda que reconhecidamente tão distante da meta ainda!

Não é primeira vez, portanto, decidido a investir no aprimoramento das emoções, na superação hábitos. É nesse sentido, pressupondo firmemente que tais podem ser revertidos em força interior. Essa resistência às inclinações internas, e aos assaques ou provocações externas. Já é convicção que dirige as minhas ações numa direção contrária das concepções mirabolantes que dominam o "mercado" das más ações no mundo.

Constante a ação, perseverante nos estudos, é necessário considerar alguns elementos na caminhada. Entre ele, para a constituição da imperturbável tranquilidade da alma, vale considerar, como já anotei aqui várias vezes o que escolhi dos estoicos para reflexão na manhã de hoje. Acrescentei, entre as leituras de hoje, mais uma vez, algumas passagens abaixo para firme reflexão em direção a ações que urgem.

Neste caminho, aproveitando o que Sêneca nos ensina, a partir do que escreveu em Carta a Lucílio (80: 4 - 5):

"O que é necessário para que sejas bom? Querer... Ora, o que de melhor podes querer do que te arrancares desta escravidão, que a todos oprime? (...) O bem que é a liberdade, terás tu de dá-lo a ti mesmo, de o reclamar a ti mesmo!"

.'.

"Quid tibi opus est ut sis bonus? uelle. Quid autem melius potes uelle quam eripere te huic seruituti quae omnes premit? (...) tibi des oportet istud bonum, a te petas)."

Quanto a essa orientação de Sêneca, de que para alguém ser Bom é necessário antes que se queira, por considerar o Bem a verdadeira liberdade perante si mesmo. A isso, então acrescento a reflexão abaixo ainda sobre o "Querer" ser bom e como "[...] o homem, pelos seus esforços, vencer as suas más inclinações."

907. "Será intrinsecamente mau o princípio originário das paixões, embora esteja na natureza?

“Não; a paixão está no excesso de que se acresceu a vontade, visto que o princípio que lhe dá origem foi posto no homem para o bem, tanto que as paixões podem levá-lo à realização de grandes coisas. O abuso que delas se faz é que causa o mal.”

908. Como se poderá determinar o limite onde as paixões deixam de ser boas para se tornarem más?

“As paixões são como um corcel, que só tem utilidade quando governado, e que se torna perigoso quando passa a governar. Uma paixão se torna perigosa a partir do momento em que deixais de poder governá-la, e que dá em resultado um prejuízo qualquer para vós mesmos ou para outrem.”

As paixões são alavancas que decuplicam as forças do homem e o auxiliam na execução dos desígnios da Providência. Mas se, em vez de as dirigir, deixa que elas o dirijam, cai o homem nos excessos e a própria força que, manejada pelas suas mãos, poderia produzir o bem, contra ele se volta e o esmaga.

Todas as paixões têm seu princípio num sentimento ou necessidade natural. O princípio das paixões não é, assim, um mal, pois que assenta numa das condições providenciais da nossa existência. A paixão propriamente dita é a exageração de uma necessidade ou de um sentimento. Está no excesso e não na causa, e este excesso se torna um mal quando tem como consequência um mal qualquer.

Toda paixão que aproxima o homem da natureza animal afasta-o da natureza espiritual.

Todo sentimento que eleva o homem acima da natureza animal denota predominância do espírito sobre a matéria e o aproxima da perfeição

909. Poderia sempre o homem, pelos seus esforços, vencer as suas más inclinações?


Sim, e por vezes fazendo esforços bem pequenos. O que lhe falta é a vontade. Ah! Quão poucos dentre vós fazem esforços!”

Ademais, isso implica a dolorosa empreitada necessária: a viagem interior. O tão propalado “autoconhecimento”. Mais uma vez, portanto, pensando no que foi dito acima, vejo que neste texto abaixo, também há uma importante orientação que tomo como breve conclusão para hoje.

A tranquiliadade da alma não se alcança em viagens

"Pensas que só a ti isso sucedeu; admiras-te, como se fosse um caso raro, de após uma tão grande viagem e uma tão grande variedade de locais visitados não teres conseguido dissipar essa tristeza que te pesa na alma!? Deves é mudar de alma, não de clima. Ainda que atravesses a vastidão do mar, ainda que, como diz o nosso Vergílio, as costas, as cidades desapareçam no horizonte, os teus vícios seguir-te-ão onde quer que tu vás. Do mesmo se queixou um dia alguém a Sócrates: «Porquê admirar-te da inutilidade das tuas viagens,» - foi a resposta, - «se para todo o lado levas a mesma disposição? A causa que te aflige é exactamente a mesma que te leva a partir!» De facto, em que pode ajudar a mudança de local, ou o conhecimento de novas paisagens e cidades? Toda essa agitação carece de sentido. Andares de um lado para o outro não te ajuda em nada, porque andas sempre na tua própria companhia. Tens de alijar o peso que tens na alma; antes disso não há terra alguma que te possa dar prazer!

Temos de viver com essa convicção: não nascemos destinados a nenhum lugar particular, a nossa pátria é o mundo inteiro! Quando te tiveres convencido desta verdade, deixará de espantar-te a inutilidade de andares de terra em terra, levando para cada uma o tédio que tinhas à partida. Se te persuadires de que toda a terra te pertence, o primeiro ponto em que parares agradar-te-á de imediato. O que tu fazes agora não é viajar, mas sim andar à deriva, a saltar de um lado para o outro, quando na realidade o que tu pretendes - viver segundo a virtude - podes consegui-lo em qualquer sítio". (SÊNECA, In: Cartas a Lucílio, 2014)

Mantenhamo-nos bem! Em esforços constantes!

Link para saber mais e estudar sobre o tema "paixões, vícios e virtudes": https://kardecpedia.com/

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