domingo, 30 de abril de 2023

REFLEXÃO MATINAL CLIV: SOBRE "LESSONS IN STOICISM" DE JOHN SELLARS

 


Enquanto faço mais uma das necessárias pausas nas leituras principais, estou  terminando esse excelente livro de John Sellaers

E, mais uma vez, meditava, há pouco, sobre se o Estoicismo NÃO é mera "autoajuda"- daquelas que muitos pagam horrores por ouvir o que se quer ouvir; do autor que foi pago exatamente para isso: para salvar as “egoidades”.

Desde que me percebi, interessado na temática, embora já tenha adotado, bem antes, um outro referencial principal, há muito tempo; passei a pensar nas referências todas, tidas como “autoajuda” (que, aliás, só ajudam quem recebe fortunas para dizê-las). Portanto, elas tem sempre um mesmo “padrão”.

Há entre essas obras as que ensinam que a todos, tudo é possível de realizar-se; basta que se “empreenda”. E, numa outra direção (que bem compreendida, aceito): as que recomendam resignação perante os insucessos e desditas. 

Notório que, por vivermos numa sociedade imediatista que defende, valoriza e divulga os que “fazem sucesso”, hajam até administradores para contas de redes sociais para mediar o alcance dessa influência ou tornar um determinado sujeito ou instituição aceito e popular: os "influencer".

Voltei a pensar nessa questão; já escrevi isto aqui. Não me ocupo, é evidente, em “mudar o mundo”, o que seria uma “contradição”, tendo em vista o estilo adotado para esta página, este blog.  Sempre, como “pano de fundo” está a necessidade de uma guinada, no ponto de vista pessoal, na compreensão de que a vida deve ser operada, numa outra chave de interpretação. Foi na esteira dessa reflexão que iniciei, há alguns anos, a leitura dos estoicos e, no que tenho estudado e escrito por aqui: os ensinamentos são aplicáveis “de mim para mim”. Compartilho-os, se houver alguém mais a ler comigo, sempre há um ou outro! Mas, o objetivo fundamental é o da própria “cura das paixões”.

Dessas leituras todas, tenho extraído, entre outras a seguinte recomendação: primeiro, um exercício de distanciamento, para longe de propostas “mercadológicas” de sucesso rápido, é o passo inicial. Segundo, a dedicação e atenção (prosoché - προσοχῆς) ao tempo e disposição para uma reviravolta e “olharmos para dentro”, para um autoconhecimento.

É aqui, juntando às reflexões de uma “filosofia de vida” adotada ainda na adolescência, que passei a estudar a obra dos estoicos, apresentada a mim, como mera autoajuda, equívoco que com o tempo vou corrigindo. Ora, se for “mera “autoajuda”, temos uma autoajuda de uma qualidade imprescindível, exatamente por apresentar uma proposta de “olhar para dentro, de autoconhecimento” e que necessariamente, não pagamos para alcançá-la.

No que acrescento aqui, um livro que acabei de reler: “The art of living: the stoics on the nature and function of philosophy hoje como “reflexão matinal”, à maneira dos estoicos, tomo como ponto de partida, alguns trechos de outro texto de John Sellars (2020). A estes, acrescento, "Lessons in Stoicism: what ancient philosophers teach us about how to live" e, no final dos comentários breves, uma série de sugestões de leituras das que tenho feito e indicado aqui.

Assim, prossigo com algumas questões propostas por Sellars.

“E se alguém lhe dissesse que grande parte do sofrimento em sua vida se deve simplesmente à maneira como você pensa sobre as coisas? Não me refiro ao sofrimento físico como dor ou fome, mas a todas as outras coisas que podem colorir negativamente a vida de uma pessoa: ansiedade, frustração, medo, decepção, raiva, descontentamento geral. E se alguém afirmasse que poderia mostrar a você como evitar tudo isso? E se eles dissessem que essas coisas eram na verdade o produto de olhar o mundo de maneira equivocada? E se a capacidade de evitar todas essas coisas estivesse totalmente sob seu controle?

Todas essas são afirmações que encontramos nas obras dos três grandes estóicos romanos – Sêneca, Epicteto e Marco Aurélio – que viveram nos séculos I e II dC. Sêneca é lembrado por seu papel como tutor do imperador Nero, Epicteto era um escravo que conquistou sua liberdade e passou a fundar uma escola filosófica, enquanto Marco Aurélio era imperador de Roma. Suas vidas não poderiam ter sido mais diferentes e, no entanto, todos adotaram o estoicismo como um guia de como viver bem.

[...]

As obras desses três estóicos romanos inspiraram os leitores desde então, falando sobre algumas das questões do dia-a-dia que enfrentam qualquer pessoa que tente navegar em seu caminho pela vida. Suas obras, fundamentalmente, são sobre como viver – como entender o seu lugar no mundo, como lidar quando as coisas não vão bem, como administrar as próprias emoções, como se comportar em relação aos outros, como viver uma vida digna de um ser humano racional. Nos capítulos seguintes, exploraremos mais alguns desses temas. Começaremos considerando o que os estóicos pensavam que sua filosofia poderia oferecer, ou seja, uma terapia para a mente. Exploraremos o que podemos e não podemos controlar e como a maneira como pensamos sobre as coisas pode gerar emoções às vezes prejudiciais. Pensaremos então sobre nossa relação com o mundo exterior e nosso lugar dentro dele. E concluiremos focando em nossos relacionamentos com outras pessoas, que tanto contribuem para as alegrias quanto para o estresse da vida diária. Como veremos, a imagem popular do estóico isolado e insensível dificilmente faz justiça à rica veia de pensamento que encontramos em nossos três estóicos romanos. Suas obras têm sido clássicos perenes e por boas razões. Sua popularidade permanece inalterada hoje, com as novas gerações encontrando lições úteis nas obras desses estóicos.”

...

“What if someone told you that much of the suffering in your life was simply due to the way you think about things? I don’t mean physical suffering like pain or hunger, but all the other things that can negatively colour one’s life: anxiety, frustration, fear, disappointment, anger, general discontent. What if someone claimed that they could show you how to avoid all of this? And what if they said that these things were in fact the product of looking at the world in a mistaken way? What if it turned out that the ability to avoid all of these things was completely within your control?

These are all claims that we find in the works of the three great Roman Stoics – Seneca, Epictetus and Marcus Aurelius – who lived in the first and second centuries AD. Seneca is remembered for his role as tutor to the Emperor Nero, Epictetus was a slave who gained his freedom and went on to set up a philosophical school, while Marcus Aurelius was Emperor of Rome. Their lives could not have been more different, and yet they all embraced Stoicism as a guide to how to live well.

[...]

The works of these three Roman Stoics have inspired readers ever since, speaking as they do to some of the day-to-day issues that face anyone trying to navigate their way through life. Their works, fundamentally, are about how to live – how to understand one’s place in the world, how to cope when things don’t go well, how to manage one’s emotions, how to behave towards others, how to live a good life worthy of a rational human being. In the chapters that follow we’ll explore some of these themes further. We’ll begin by considering what the Stoics thought their philosophy could offer, namely a therapy for the mind. We’ll explore what we can and cannot control, and how the way we think about things can generate sometimes harmful emotions. We’ll then think about our relationship with the outside world and our place within it. And we’ll conclude by focusing on our relationships with other people, which contribute so much to both the joys and the stresses of daily life. As we shall see, the popular image of the isolated and unfeeling stoic hardly does justice to the rich vein of thought that we find in our three Roman Stoics. Their works have been perennial classics, and for good reason. Their popularity remains undiminished today, with new generations finding helpful lessons in the works of these Stoics.

Et une traduction rapide en français :

Et si quelqu'un vous disait qu'une grande partie de la souffrance dans votre vie était simplement due à votre façon de penser les choses? Je ne parle pas de souffrance physique comme la douleur ou la faim, mais de toutes les autres choses qui peuvent colorer négativement la vie: anxiété, frustration, peur, déception, colère, mécontentement général. Et si quelqu'un affirmait qu'il pouvait vous montrer comment éviter tout cela? Et s'ils disaient que ces choses étaient en fait le produit de regarder le monde d'une manière incorrecte? Et s'il s'avérait que la capacité d'éviter toutes ces choses était entièrement sous votre contrôle? 

Ce sont toutes des affirmations que l'on retrouve dans les œuvres des trois grands stoïciens romains - Sénèque, Épictète et Marc Aurèle - qui ont vécu aux premier et deuxième siècles de notre ère. On se souvient de Sénèque pour son rôle de précepteur de l'empereur Néron, Épictète était un esclave qui a obtenu sa liberté et a ensuite créé une école philosophique, tandis que Marc Aurèle était empereur de Rome. Leurs vies n'auraient pas pu être plus différentes, et pourtant ils ont tous adopté le stoïcisme comme guide pour une vie bonne.

[...]

Depuis lors, les œuvres de ces trois stoïciens romains ont inspiré les lecteurs, faisant encore écho à certains des problèmes quotidiens auxquels sont confrontés tous ceux qui tentent de se frayer un chemin dans la vie. Leurs œuvres, fondamentalement, portent sur la manière de vivre - comment comprendre sa place dans le monde, comment faire face quand les choses ne vont pas bien, comment gérer ses émotions, comment se comporter envers les autres, comment vivre une vie bonne digne d'un être humain rationnel. Dans les chapitres qui suivent, nous approfondirons certains de ces thèmes. Nous commencerons par considérer ce que les stoïciens pensaient que leur philosophie pouvait offrir, à savoir une thérapie pour l'esprit. Nous explorerons ce que nous pouvons et ne pouvons pas contrôler, et comment notre façon de penser les choses peut générer des émotions parfois nuisibles. Nous réfléchirons ensuite à notre relation avec le monde extérieur et à notre place en son sein. Et nous conclurons en nous concentrant sur nos relations avec les autres, qui contribuent tant aux joies qu'aux stress de la vie quotidienne. Comme nous le verrons, l'image populaire du stoïcien isolé et insensible ne rend guère justice à la riche veine de pensée que nous trouvons dans nos trois stoïciens romains. Leurs œuvres sont des classiques éternels, et pour cause. Leur popularité reste intacte aujourd'hui, de nouvelles générations trouvant des leçons utiles dans les œuvres de ces stoïciens.”

Volto agora mesmo aos estudos!

Fique forte, fique bem

______.

ARRIANO FLÁVIO. O Encheirídion. Edição Bilíngue. Tradução do texto grego e notas Aldo Dinucci; Alfredo Julien. Textos e notas de Aldo Dinucci; Alfredo Julien. São Cristóvão. Universidade Federal de Sergipe, 2012).

CUNHA, Bruno. A gênese da ética em Kant. São Paulo: Editora LiberArs, 2017.

______. Lições sobre a doutrina filosófica da religião. Trad. Bruno Cunha. Petrópolis, RJ: Vozes, 2019.

EPICTÉTE. Entretiens. Livre I, II, III, IV. Trad. Joseph Souilhé. Paris: Les Belles Lettres, 1956.

______. Epictetus Discourses. Trad. Dobbin. Oxford: Clarendon, 2008.

______. O Encheirídion de Epicteto. Trad. Aldo Dinucci; Alfredo Julien. São Cristóvão: EdiUFS, 2012. (Edição Bilíngue).

______. Testemunhos e Fragmentos. Trad. Aldo Dinucci; Alfredo Julien. São Cristóvão: EdiUFS, 2008.

______. The Discourses of Epictetus as reported by Arrian; fragments: Encheiridion. Trad. Oldfather. Harvard: Loeb, 1928.  https://www.loebclassics.com/

GALENO. Aforismos. São Paulo: E. Unifesp, 2010.

______. On the passions and errors of the soul. Translated by Paul W . Harkins with an introduction and interpretation by Walter Riese. Ohio State University Press, 1963.

GAZOLLA, Rachel.  O ofício do filósofo estóico: o duplo registro do discurso da Stoa, Loyola, São Paulo, 1999.

HADOT, Pierre. The inner citadel: the meditations of Marcus Aurelius. London: Harvard University Press, 2001.

HANH, Thich Nhat. Meditação andando: guia para a paz interior. 21. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.

KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes. Trad. Guido A. de Almeida. São Paulo: Discurso editoria: Barcarola, 2009.

______. Lições de ética. Trad. Bruno Cunha e Charles Fedhaus. São Paulo: Editora Unesp, 2018.

______. O único argumento possível para uma demonstração da existência de Deus. Lisboa: INCM, 2004.

KARDEC, A. Le Livre des Esprits. Paris, Dervy-Livres, s.d. (dépôt légal 1985). (O Livro dos Espíritos. Trad. Guillon Ribeiro, ______. O livro dos Espíritos. 93. ed. - 1. reimpressão (edição histórica). Brasília, DF: Feb, 2013a. (Q. 74a “A razão”); Q. 907-912: "paixões"; 893-906: “virtudes e vícios”e 920-933: "felicidade")

KING, C. Musonius Rufus: Lectures and Sayings. CreateSpace Independent Publishing Platform, 2011.

LONG, A. A. Epictetus: a stoic and socratic guide to life. New York: Oxford University Press. 2007.

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______. Pense como um imperador. Trad. Maya Guimarães. Porto Alegre: Citadel Editora, 2020.

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RUSSEL, Bertrand. A conquista da felicidade. Rio de Jamneiro, RJ: Nova Fornteira, 2015.

SCHLEIERMACHER, F. D. E. Introdução aos Diálogos de Platão. Belo Horizonte, MG: Ed. UFMG, 2018.

SCHELLE, Karl Gottlob. A arte de passear. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

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______. Lições de estoicismo: O que os filósofos antigos têm a ensinar sobre a vida. Rio de Janeiro: Editora Sextante, 2023.

______. Lessons in Stoicism: What ancient philosophers teach us about how to live.  Londres: Penguin Books Ltd, 2020.

______. Hellenistic Philosophy. Oxford University Press, 2018.

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SOLNIT, Rebecca. Wanderlust: a history of walking. Penguim books, 2001.

SCHNEEWIND, Jeromé. Obligation and virtue: an overwien of Kant's moral philosophy. The Cambridge Companio to Kant. United Kingdom. Cambridge University Press, 1992.

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______. A invenção da autonomia: uma história da filosofia moral moderna. São Leopoldo: Unisinos, 2001. 

THOUREAU, Henry David. Andar a pé: um ritual interior de sabedoria e liberdade. Loures: Editora Alma dos livros, 2021.

 

sexta-feira, 21 de abril de 2023

RELENDO "INTRODUÇÕES" AO PENSAMENTO KANTIANO (III)


Em andamento... (estudando o tema)

Ora, prossigo, pois vejo aqui, corpo e alma (o velho problema mente-corpo) numa clara unidade e interdependência:

O homem foi criado para receber as impressões e sentimentos que o mundo deve despertar nele, por este corpo que é a parte visível de seu eu, e cuja matéria serve não somente ao espírito invisível que ocupa este corpo, de modo que ali se imprimam os primeiros conceitos dos objetos exteriores, mas é também indispensável na atividade interior da repetição, da ligação, enfim do pensamento (KANT AA 1:355)”

...

L’homme a été crée pour recevoir les impressions et émotions que le monde doit éveiller em lui par ce corps qui est la partie visible de son être, et dont la matière sert non seulement à l’esprit invisible qui habite ce corps, pour que s’y impriment es premiers concepts des objets extérieurs, mais est aussi indispensable dans l’activité intérieure de la répétion, de la liasion, bref de la pensée”.

______.

Para saber mais:

Link 1: “Kant’s Second Paralogism, On the Simplicity of the Soul”:

https://structureandflux.com/?p=836&fbclid=IwAR0yBJ1JDJ5tvlJZ7Qq1uq4JIy_U7-1fT7losU-tmGo4zlDFmnUdoR0PeLA

Link 2: "A Dependência Material e a Refutação do Idealismo de Kant":

https://www.facebook.com/SpringerPhilosophy/photos/a.398254470269606/6264613460300315/

Lendo, dessa revista: "Material Dependence and Kant’s Refutation of Idealism".

"No quarto paralogismo (KrV A) acredita-se capaz de refutar o cético ao demonstrar que a percepção externa é imediata. esta estratégia. Na Refutação do Idealismo (KrV B) Kant promove a dependência material do sentido interior sentido externo."

"O artigo argumenta que na Crítica da Razão Pura Kant desenvolve duas estratégias anti-céticas. No quarto paralogismo (KrV A) acredita-se capaz de refutar o cético ao demonstrar que a percepção externa é imediata. esta estratégia é pouco convincente. Na Refutação do Idealismo (KrV B), Kant promove a dependência material do sentido interior sentido externo. Mostro que o argumento de Kant para a dependência material tem sido amplamente negligenciado, embora seja o mais forte argumento contra o ceticismo do mundo externo que ele desenvolve, uma vez que antecipa o externalismo do conteúdo mental enquanto preserva idealismo transcendental e realismo empírico."

______.

BECKENKAMP, Joãosinho. Introdução à filosofia crítica de Kant. Editora UFMG,  2017.

CUNHA, Bruno. A gênese da ética em Kant. São Paulo: Editora LiberArs, 2017.

______. Lições sobre a doutrina filosófica da religião. Trad. Bruno Cunha. Petrópolis, RJ: Vozes, 2019.

FERRY, Luc. Kant: uma leitura das três "Críticas". 3. ed. Rio de Janeiro: Difel, 2009.

GUYER, PAUL. The Cambridge companion to Kant. Cambrridge University Press, UK, 1992.

HÖFFE, Otfriede. Immanuel Kant. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

______. Immanuel Kant. München: C. H. Beck, 2004.

______. Kant: crítica da razão pura: os fundamentos da filosofia moderna. São Paulo: Edições Loyola, 2013.

KANT, Immanuel. Crítica da razão pura. 3. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbekian, 1994.

______. Crítica da razão prática. Edição bilíngüe.Tradução Valerio Rohden. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

____. Crítica da faculdade do juízo. Trad.Valerio Rohden e António Marques. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1993.

______. Dissertação de 1770. De mundi sensibilis atque inteligibilis forma et principio. Akademie-Ausgabe. Trad. Acerca da forma e dos princípios do mundo sensível e inteligível. Trad., apres. e notas de L. R. dos Santos. Lisboa: Imprensa Casa da Moeda. FCSH da Universidade de Lisboa, 1985.

______. Prolegômenos a qualquer metafísica futura que possa apresentar-se como ciência. Trad. José Oscar de Almeida Marques. São Paulo: Estação Liberdade, 2014)

______. Prolegômenos a toda metafísica futura. Lisboa: Edições 70, 1982

KANT, Immanuel. Histoire Générale de la Nature et Théorie du ciel. Trad. Pierre Kerszberg, Anne-Marie Roviello e Jean Seidengart. Vrin 1984).

PORTA, Mário Ariel González. O pensamento de Immanuel Kant. Academia Monergista, 2023.

WATKINS, Eric. Kant and the sciences. Oxford University Press, 2001.

domingo, 16 de abril de 2023

MEDITAÇÃO RETROSPECTIVA NOTURNA: "AS PAIXÔES DA ALMA"


"
Um clássico é um livro que nunca terminou de dizer aquilo que tinha para dizer." (CALVINO, 2007, p. 11)

.'.

Retornando aos poucos às atividades normais, ao intenso trabalho e, enquanto isso, retomando alguns capítulos, nos últimos dias, de duas obras  de René Descartes que desde a graduação, sempre revisito. É só por serem clássicos valem ler e reler como clássicos, uma regra por aqui. Nenhum dos meus interesses excluem os clássicos. Indispensáveis!

E, ainda , tomando o estudo do tema como uma das tarefas fundamentais e, com certeza, para alcançar 'Aταραξία - ataraxia e ἀπάθεια - apátheia. Como sempre digo quando são desse tipo, estão bem em consonância com os enunciados básicos que, como princípios, já são adotados aqui, pois:

"[...] se a razão prevalecer, as paixões nem sequer começarão; mas se elas se encaminharem contra a vontade da razão, elas se manterão contra a vontade da razão. Pois é mais fácil detê-las no começo do que controlá-las quando ganham força." (DESCARTES. InPaixões da alma.)

. ' .

As duas obras a que me refiro: "Regras Para a Direção do Espírito" e "As paixões da alma", de René Descartes, um dos grandes, de quem sempre extraio excertos para reflexões no blog.

Aqui, no caso, As paixões da alma; sempre revisitando essa brevíssima reflexão dela selecionada, sobre as "emoções":

"Ora, visto que essas emoções interiores nos tocam mais de perto e têm, por conseguinte, muito mais poder sobre nós do que as paixões que se encontram com elas, e das quais diferem, é certo que, contanto que a alma tenha sempre do que se contentar em seu íntimo, todas as perturbações que vêm de outras partes não dispõem de poder algum para prejudicá-la. Servem, antes, para lhe aumentar a alegria, pelo fato de, vendo que não pode ser por elas ofendido, conhecer com isso a sua própria perfeição. E, para que a nossa alma tenha assim do que estar contente, precisa apenas seguir estritamente a virtude. Pois quem quer que haja vivido de tal maneira que sua consciência não possa censurá-lo de alguma vez ter deixado de fazer todas as coisas que julgou serem as melhores (que é o que chamo aqui seguir a virtude), recebe daí uma satisfação tão poderosa para torná-lo feliz que os mais violentos esforços da paixão nunca têm poder suficiente para perturbar a tranqüilidade de sua alma".

Em andamento...

Mais sobre o tema emhttps://marcosfilosofiamoderna.blogspot.com/

Link para saber mais e estudar sobre o tema "paixões, vícios e virtudes" da alma em outra perspectiva: https://kardecpedia.com/

______.

BECKENKAMP, Joãosinho. Introdução à filosofia crítica de Kant. Editora UFMG,  2017.

CREWS, Frederick. (Ed.). Unauthorized Freud: doubters confront a legend. New York: Penguin, 1999.

______. Freud: The making of an Illusion. New York: Metropolitan Books/Henry Holt & Company, 2017.

______. Out of my System: psychoanalysis, ideology, and critical method. Oxford University Pres, 1975.

______. O gênio da retórica. In: Folha de São Paulo (Caderno Mais+). São Paulo, domingo, 22 de outubro de 2000. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs2210200012.htmAcesso em: 25 de fevereiro de 2022.

DESCARTES, René. As paixões da alma. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

FERMÉ, Eduardo; HANSSON, Sven Ove. Belief Change: introduction and overview. Springer,  2018.

FERRY, Luc. Kant: uma leitura das três "Críticas". 3. ed. Rio de Janeiro: Difel, 2009.

FREUD, Sigmund. Interpretação dos sonhos. Obras completas. vol 4. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.

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GUYER, PAUL. The Cambridge companion to Kant. Cambrridge University Press, UK, 1992.

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______. “Falsificationism Falsified”, Foundations of Science, 11: 275–286, 2006.

______. “Values in Pure and Applied Science”, Foundations of Science, 12: 257–268, 2007.

______. “Philosophy in the Defence of Science”, Theoria, 77(1): 101–103, 2011.

______. “Defining pseudoscience and science”, pp. 61–77 in Pigliucci and Boudry (eds.), 2013.

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IZQUIERDO, Ivan. A arte de esquecer: cérebro, memória e esquecimento. 2. ed.  Rio de Janeiro: Vieira & Lent, 2010.

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JUNG. Carl Gustav. Freud e a psicanálise. 6. ed. Petrópolis/RJ: Editora Vozes, 2011. (Obras completas, Vol. 4)

______. Psicologia do inconsciente. 22. ed. Petrópolis/RJ: Editora Vozes, 2011. (Obras completas, Vol. 7/1).

______. O eu e seu inconsciente. 27. ed. Petrópolis/RJ: Editora Vozes, 2011. (Obras completas, Vol. 7/2).

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KANT, Immanuel. Crítica da razão pura. 3. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbekian, 1994.

KRAUS, Katharina T. Kant on self-knowledge and sel-formation: the nature on inner experience. Cambrige University, 2020.

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____. Crítica da faculdade do juízo. Trad.Valerio Rohden e António Marques. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1993.

______. Dissertação de 1770. De mundi sensibilis atque inteligibilis forma et principio. Akademie-Ausgabe. Trad. Acerca da forma e dos princípios do mundo sensível e inteligível. Trad., apres. e notas de L. R. dos Santos. Lisboa: Imprensa Casa da Moeda. FCSH da Universidade de Lisboa, 1985.

______. Prolegômenos a qualquer metafísica futura que possa apresentar-se como ciência. Trad. José Oscar de Almeida Marques. São Paulo: Estação Liberdade, 2014)

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LEBRUN, G. Kant e o fim da metafísica. Martins Fontes, São Paulo, 1993.

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POPPER, Karl. Lógica da pesquisa científica. São Paulo: Edusp, 1993.

______. Conjecturas e refutações. Trad. Bath S. Brasília: UB, 1972.

______. Os dois problemas fundamentais da teoria do conhecimento. São Paulo: Editora Unesp, 2013.

______. O conhecimento e o problema mente-corpo. Lisboa: Edições 70, 2009.

______; ECCLES, J. C. O cérebro e o pensamento. Campinas, SP: Papirus; Brasília, DF: Ed. Universidade de Brasília, 1992.

______. O conhecimento objetivo. Belo Horizonte, MG: Itatiaia, 1999.

______. O eu e seu cérebro. Campinas, SP: Papirus; Brasília, DF: Ed. Universidade de Brasília, 1995.

WATKINS, Eric. Kant and the sciences. Oxford University Press, 2001.

XAVIER, Leiserée Adriene Fritsch.  Kant a Freud: o imperativo categórico e o superego. José Ernani de Carvalho Pacheco (editor). Curitiba, PR:  Editora Juruá, 2009.  

sábado, 15 de abril de 2023

ATUALIZANDO LEITURAS E ESTUDOS: IDEALISMO NA FILOSOFIA MODERNA



Novo livro sobre o Idealismo para leitura em breve:

"[...] lançamento do volume Idealism in Modern Philosophy, de Paul Guyer e Rolf-Peter Horstmann (Oxford University Press, 2023).

Do site da editora:

Este livro conta a história do idealismo na filosofia moderna, desde o século XVII até a virada do século XXI. Paul Guyer e Rolf-Peter Horstmann definem o idealismo como a redução de toda a realidade a algo de natureza mental. Ao invés de distinguir entre versões metafísicas e epistemológicas do idealismo, eles distinguem entre motivações metafísicas e epistemológicas para o idealismo. Eles argumentaram que, embora os argumentos metafísicos para o idealismo raramente tenham sido aceitos, por exemplo, pelo bispo Berkeley no início do século XVIII e pelos idealistas britânicos Bradley e McTaggart no final do século XIX e início do século XX, os argumentos epistemológicos para o idealismo foram amplamente aceitos, mesmo na chamada filosofia analítica do século XX.

Guyer e Horstmann discutem muitos filósofos que desempenharam um papel no desenvolvimento do idealismo, de Descartes, Hobbes, Spinoza, Leibniz, Locke, Berkeley e Hume, até Kant; os idealistas alemães Fichte, Schelling e Hegel; Schopenhauer e Nietzsche; os idealistas britânicos e americanos, como Green e Royce, além de Bradley e McTaggart; GE Moore e Bertrand Russell, neokantianos como Ernst Cassirer; e filósofos do século XX, como Wittgenstein, Collingwood, Carnap, Sellars e McDowell."

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"We are glad to give notice of the release of the volume Idealism in Modern Philosophy by Paul Guyer and Rolf-Peter Horstmann (Oxford University Press, 2023).

From the publisher’s website:

This book tells the story of idealism in modern philosophy, from the seventeenth century to the turn of the twenty-first. Paul Guyer and Rolf-Peter Horstmann define idealism as the reduction of all reality to something mental in nature. Rather than distinguishing between metaphysical and epistemological versions of idealism, they distinguish between metaphysical and epistemological motivations for idealism. They argue that while metaphysical arguments for idealism have only rarely been accepted, for example by Bishop Berkeley in the early eighteenth century and the British idealists Bradley and McTaggart in the late nineteenth and early twentieth centuries, epistemological arguments for idealism have been widely accepted, even in the so-called analytic philosophy of the twentieth century.

Guyer and Horstmann discuss many philosophers who have played a role in the development of idealism, from Descartes, Hobbes, Spinoza, Leibniz, Locke, Berkeley, and Hume, through Kant; the German idealists Fichte, Schelling, and Hegel; Schopenhauer and Nietzsche; the British and American idealists such as Green and Royce in addition to Bradley and McTaggart; G.E. Moore and Bertrand Russell, Neo-Kantians such as Ernst Cassirer; and twentieth-century philosophers such as Wittgenstein, Collingwood, Carnap, Sellars, and McDowell."

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BAVARESCO, Agemir Bavaresco; TAUCHEN, Jair Tauchen; PONTEL, Evandro Pontel (Orgs.). De Kant a Hegel: Leituras e atualizações. - Porto Alegre, RS: Editora Fi, 2019.

BECKENKAMP, Joãosinho. Entre Kant e Hegel. Porto Alegre: Edipucrs, 2004, 288 p.

FERREIRO, Héctor; HOFFMANN, Thomas Sören; BAVARESCO, Agemir (Orgs.). Los aportes del itinerario intelectual de Kant a Hegel. Porto Alegre, RS, Editora Fi: EDIPUCRS, 2014. (Comunicaciones del I Congreso GermanoLatinoamericano sobre la Filosofía de Hegel. Português./Espanhol)

FERRY, Luc. Kant: uma leitura das três "Críticas". 3. ed. Rio de Janeiro: Difel, 2009.

GUYER, PAUL. The Cambridge companion to Kant. Cambrridge University Press, UK, 1992.

HÖFFE, Otfriede. Immanuel Kant. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

______. Immanuel Kant. München: C. H. Beck, 2004.

______. Kant: crítica da razão pura: os fundamentos da filosofia moderna. São Paulo: Edições Loyola, 2013.

KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes. Trad. Guido A. de. São Paulo: Discurso editoria: Barcarola, 2009.

______. Textos pré-críticos. São Paulo: Editora Unesp, 2005.

______. Textos seletos. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.

______. Investigação sobre a clareza dos princípios da teologia e da moral. Lisboa: Imprensa Casa da Moeda, 2007.

KANT, Immanuel. Crítica da razão pura. 3. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbekian, 1994.

______. Crítica da razão prática. Edição bilíngüe. Tradução Valerio Rohden. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

____. Crítica da faculdade do juízo. Trad.Valerio Rohden e António Marques. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1993.

______. Dissertação de 1770. De mundi sensibilis atque inteligibilis forma et principio. Akademie-Ausgabe. Trad. Acerca da forma e dos princípios do mundo sensível e inteligível. Trad., apres. e notas de L. R. dos Santos. Lisboa: Imprensa Casa da Moeda. FCSH da Universidade de Lisboa, 1985.

______. Prolegômenos a qualquer metafísica futura que possa apresentar-se como ciência. Trad. José Oscar de Almeida Marques. São Paulo: Estação Liberdade, 2014)

______. Prolegômenos a toda metafísica futura. Lisboa: Edições 70, 1982.

NOVELLI, Pedro Geraldo Aparecido. In: Rev. Simbio-Logias. V.1, n.1, mai/2008.

PHILONENKO, Alexis. Études kantiennes. Librairie philosophique J. Vrin, Paris, 1982.

REFLEXÃO MATINAL CLIII: MEDIDAS PROFILÁTICAS... EDUCAÇÃO. AINDA SOBRE A "DICOTOMIA DO CONTROLE" (IV)

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 "O ser humano nasce com uma inclinação na direção da virtude."  

( Musonius Rufus)

Tem sido bastante comum encontrarmos reflexões sobre a “natureza humana” na obra dos Estoicos, aliás, tema fundamental para eles. O mesmo Musonius Rufus teria dito que Todos nós fomos feitos pela natureza, de forma que possamos viver livre de erros e de forma nobre, não que um possa e outro não possa, todos podemos.”

Também não é difícil encontrar, atualmente, opositores ensandecidos, desequilibrados, a insistirem na negação de que se possa nascer com inclinação para as virtudes. Preferem defender que possa haver no homem uma natureza corrupta em si mesma do que admitir que, na verdade, haveria a possibilidade de que uma certa “natureza humana” pudesse ter se corrompido; que se tenha tomado direções equivocadas e desviado da meta, a qual como diz Musonius Rufus“todos podemos” chegar. E, a filosofia seria uma ferramenta para retorno à nossa verdadeira “natureza humana”.

O que se aprenderá com a filosofia, no modo defendido aqui é que ela pode sim revelar-nos uma "essência" em nós. O erro será uma constante mesmo na vida de quem persista em agir corretamente, daí não se poder ratificar que há uma natureza corrompida; pelo contrário, o que haveria é que, no exercício cotidiano a ocorrência dos erros e dos desvios de rota sempre se apresentam.

Isso, exigirá sempre, uma profunda e repetida reflexão, por parecer apontar na direção de uma solução distante e quase impossível. Os Estoicos, defendem que qualquer um pode reverter um mau comportamento, reparar os erros e se reorientar na direção no caminho das Virtudes dedicando-se ao estudo regular, constante e disciplinado da filosofia. Para eles a prática das virtudes começa por aí e prossegue-se aprendendo a separar o que é bom (virtude) do que é mau (vícios).

A meta, portanto: aprendermos a admitir que há coisas às quais podemos impor nosso controle e há coisas que fogem da nossa alçada e é pífio o poder de termos controle sobre elas. O que a proposta dos Estóicos sugere é que se exercite as ações em consonância com as que fogem ao nosso domínio, que estariam, talvez, no domínio das leis naturais. A Filosofia é tomada, portanto, como prática diária na correção dos erros e na compreensão e aceitação das próprias limitações.

Uma profilaxia? Educação?

Ademais:

"O que então significa ser verdadeiramente educado? É aprender a aplicar nossos conceitos naturais às coisas certas e em concordância com a Natureza, e além disso, separar as coisas que estão em nosso poder daquelas que não estão." (Epictetus)

Dessas minhas leituras sobre estoicismo um notório princípio para prática de sua filosofia é um conjunto de três “exercícios práticos”. Os objetivos estóicos estão, sempre ajustados de forma a dar mais valor à ação do que às palavras. A maneira de agir de cada indivíduo que pretenda ser um estóico é priorizada devido ao fato de que verdadeiramente a ação mostra como uma pessoa realmente é. Daí a incessante busca, realizando exercícios práticos no cotidiano para alcançar a eustatheia (tranquilidade) e euthymia (crença em si). Aqui, só vou mostrar o primeiro exercício que é proposto pelos estóicos como ponto de partida para compreensão e prática de sua filosofia. São três exercícios fáceis e possíveis de serem realizados em qualquer tempo.

Bastante interessante, para mim, e um dos temas divulgados pelos estóicos: a reflexão matinal. O estóico Marco Aurélio, por exemplo, em suas Meditações como estóico, apresenta estes exercícios práticos que consistem sempre, como foi dito, em práticas simples. Ao acordar, agradeça por que você acordou e terá um novo dia com novas oportunidades pela frente. Segundo essa prática, o exercício se daria dessa forma:

No momento em que despertamos de uma noite sono, agradeçamos por ter acordado e por termos mais uma oportunidade num novo dia. Em seguida, tranquilamente sentemo-nos e pensemos no dia a se iniciar e como pretendemos vivê-lo, sem ter aqui a pretensão de estabelecer metas, planos.

Na verdade, o que importa aqui é pensar a maneira como nós enfrentaremos nossos vícios e como exercitaremos nossas virtudes. Algum conceito filosófico será exercitado e aplicado; alguma habilidade intelectual, um idioma, um tema de uma determinada área será posto em prática? Como faremos isso de forma efetiva? Como compor o nosso dia, que estamos iniciando, de forma a incluirmos esses exercícios?

Durante o dia, com certeza, inúmeras dificuldades aparecerão e, serão necessárias profundas reflexões sobre a forma como reagiremos a cada um.

Enfim, tomando o texto de Epictetus utilizado aqui para essa reflexão inicial, é fundamental, já praticando o exercício estóico, reconhecermos que não podemos controlar nada além dos nossos próprios pensamentos, nossas escolhas, vícios ou virtudes; nem tudo distante disso estará sob nosso controle. O que nos acontece à nossa volta serão eventos por nós percebidos que, no entanto, podemos optar por mantermos a calma e a tranquilidade diante deles, serenamente e sem nos distanciarmos da proposta inicial que pretendemos levar a cabo. 

Eis o primeiro exercício... em andamento!

Voltando aos estudos! 

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SUGESTÕES DE LEITURA:

1. HADOT, Pierre. A filosofia como maneira de viver: entrevistas de Jeannie Carlier e Arnold I. Davidson. (Trad. Lara Christina de Malimpensa). São Paulo: É Realizações, 2016.

“Em uma série de entrevistas com Arnold I. Davidson e Jeannie Carlier, Pierre Hadot revela as chaves de seu itinerário de vida e de seu pensamento filosófico. Com base em suas reflexões sobre a filosofia antiga, Hadot descobre uma maneira de filosofar segundo a qual fazer filosofia não consiste em resolver problemas abstratos, mas em melhorar nossa forma de viver. O gênero da entrevista permite ao leitor penetrar de forma amena no pensamento de Hadot."

2. ______. Exercícios Espirituais e Filosofia Antiga. Trad. Flavio Fontenelle Loque e Loraine Oliveira. Prefácio de Davidson, Arnold. São Paulo: É Realizações, 2014.

“Nos ensaios reunidos neste volume, o filósofo e historiador da filosofia Pierre Hadot traça o panorama histórico da noção de “exercício espiritual” e traz novamente à cena filosófica o debate acerca do estatuto da filosofia e da figura do filósofo. Com ele, voltamos a pensar o quanto a filosofia deixou de ser uma “atividade”, uma prática, para se tornar, cada vez mais, um “discurso”. Hadot propõe, ao contrário, um resgate da filosofia como “maneira de viver”.

(Grifos e destaques são meus)

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ARRIANO FLÁVIO. O Encheirídion. Edição Bilíngue. Tradução do texto grego e notas Aldo Dinucci; Alfredo Julien. Textos e notas de Aldo Dinucci; Alfredo Julien. São Cristóvão. Universidade Federal de Sergipe, 2012).

EPICTÉTE. Entretiens. Livre I, II, III, IV. Trad. Joseph Souilhé. Paris: Les Belles Lettres, 1956.

______. Epictetus Discourses. Trad. Dobbin. Oxford: Clarendon, 2008. 

______. O Encheirídion de Epicteto. Trad. Aldo Dinucci; Alfredo Julien. São Cristóvão: EdiUFS, 2012. (Edição Bilíngue). 

______. Testemunhos e Fragmentos. Trad. Aldo Dinucci; Alfredo Julien. São Cristóvão: EdiUFS, 2008. 

______. The Discourses of Epictetus as reported by Arrian; fragments: Encheiridion. Trad. Oldfather. Harvard: Loeb, 1928.  https://www.loebclassics.com/

GAZOLLA, Rachel.  O ofício do filósofo estóico: o duplo registro do discurso da Stoa, Loyola, São Paulo, 1999.

HADOT, Pierre. The inner citadel: the meditations of Marcus Aurelius. London: Harvard University Press, 2001.

HANH, Thich Nhat. Meditação andando: guia para a paz interior. 21. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.

______. Silêncio: o poder da quietude em um mundo barulhento. Rio de Janeiro, RJ: Harper Collins, 2018.

SCHELLE, Karl Gottlob. A arte de passear. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

SÊNECA, Lúcio Aneu. Cartas a Lucílio. 5. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbekian, 2014.

______. Lucio Aneu. Vida Feliz. 2. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009.

______. Edificar-se para a morte: das cartas morais a Lucílio. Petrópolis, RJ: Vozes, 2016.

______. Sobre a brevidade da vida. Porto Alegre, RS: L&PM, 2007.

SOLNIT, Rebecca. Wanderlust: a history of walking. Penguim books, 2001.

THOUREAU, Henry David. Andar a pé: um ritual interior de sabedoria e liberdade. Loures: Editora Alma dos livros, 2021.

 

 

O SUPOSTO "CONFLITO CIÊNCIA X RELIGIÃO" (II)

Recentemente, acrescentei, uma obra de  Alvin Plantinga  que até recentemente não conhecia: “ Ciência, religião e naturalismo:  onde está o ...