sábado, 27 de março de 2021

ÉTICA DAS VIRTUDES: PHILIPPA FOOT

 



                                                                                                                                               
MARQUINHOS

Anotações (em construção e, relendo, atualizando e acrescentando hoje, numa pausa rápida aqui, a bibliografia)

O que é virtude?

Tem sido comum as discussões sobre a virtude; não somente entre os estoicos, mas em meio à sociedade, em geral. E, não é raro que se ouçam dizer que o mundo atual tem se tornado tão vazio de sentido por não haver uma preocupação com essa questão. Nesse sentido, diria  Sêneca:

“A razão é igual à razão, tal como a rectidão é igual a si mesma; por conseguinte toda a virtude é igual à virtude, pois a virtude outra coisa não é senão a razão recta. Todas as virtudes são formas da razão; são formas da razão se forem todas rectas e se forem rectas são todas iguais. ” (LXVI.32)

Ou seja: “a virtude é a razão reta.”

Tenho estudado bastante e publicado aqui, alguns temas de teor filosófico diverso, nos quais me exercito. São diversos entre si, mas preservam uma linha tênue de relação: “ética”, “bioética”“filosofia da religião”, o “problema mente-corpo” e o “estoicismo”. Na verdade, publico-os aqui somente para manter salvos os textos e retomá-los num futuro com fins de correção e sistematização. E, entre estes temas está o da Virtude.

Um dia desses, no entanto, sem sair da temática já apontada e que tem sido constante, publiquei aqui uma frase, como tenho feito, exercitando como já disse, a redação. Ainda que fosse só um exercício despretensioso na direção do aperfeiçoamento da escrita, a frase, bem curta e sem muito "ineditismo" reforçava uma postura contrária que mantenho em relação aos nocivos “modismos contemporâneos”, e quem me conhece sabe do que digo. A frase, a que me refiro e sustento serenamente, não com argumentos complexos, que aliás me agradam; mas por mera posição pessoal foi essa: "A essência não só precede à existência como ainda sobreviverá a ela." (MARQUINHOS, 2017)

A ela acrescento uma frase de Epictetus e avanço numa breve reflexão:

"Proteja o bem que existe em você em tudo o que você fizer, e no que diz respeito a todo o resto, receba o que lhe for dado enquanto puder fazer uso sensato. Se não puder, não terá sorte, estará propenso a falhar, perturbado e limitado." (Epictetus)

Para a típica forma de pensar e filosofar dos estoicos haveria, em nós, algo que se preserva em certa medida na execução do pensamento lógico universal, e dessa forma estaria garantida uma coerência e um equilíbrio que auxiliariam na tarefa de cada ser humano no exercício prático e constante de tornar-se a cada dia uma pessoa melhor; uma boa pessoa que segundo o que diz Epictetus, por haver uma essência esta deve ser preservada em nós como uma centelha interior que não pode se extinguir.

As nossas ações, no entanto, devem ser pensadas e direcionadas de certa forma ao bem comum sob pena de ela, para nós perder força e nos enfraquecer nos juízos que nos sejam pedidos acerca de decisões e sobre uma ou outra necessidade de tomar como certo ou verdadeiros atos do nosso cotidiano. Não havendo tal possibilidade de se estabelecer limites, haveria sim se os que, ultrapassando essas barreiras avançassem na ação que prejudicasse a outrem ou a si mesmos. Enfim, Epictetus, recomenda que não percamos essa nossa essência; que façamos o que é certo, o nosso dever.

E, também o imperador e filósofo Marco Aurélio teria escrito em suas Meditações: “Se não é certo, não faça. Se não é verdade, não diga”.

Interessa ressaltar aqui que mesmo sendo um imperador ele fazia esse tipo de ponderação; preservando-se distante do comum dos homens de seu tempo e assegurando a proteção da sua própria essência, similar ao pensamento de Epictetus, ressalte-se; nunca agindo sem estar certo nem faltando com a verdade.

É certo que ao ler este brevíssimo texto, alguém irá esbravejar sobre a questão da liberdade e da possibilidade de podermos fazer o que quisermos das nossas ações e vivermos cada um a sua própria vida do jeito e forma que achar melhor. O problema é atingirmos ou prejudicarmos alguém. Também alertando para o fato de que ao preservarmos aquela essência estaremos mantendo a nossa própria individualidade de forma que não se apague. Reafirma Marco Aurélio: "Meu único medo é fazer algo contrário à natureza humana ;  a coisa errada, do jeito errado, ou no momento errado." (Meditações. 7.20)

Uma reflexão que, com certeza, vou retomar, corrigir e aprofundar e que, recentemente, me levou mais diretamente a partir da Ética das virtudes, a alguns livros de Philippa Foot, que acabei de ler. Seu pensamento, de herança aristotélica, tem me ajudado a refletir sobre alguns tópicos em relação às Virtudes, um dos temas centrais nesta página. Acrescentei abaixo três dos livros dela que li recentemente e, com o tempo vou publicando aqui breves “resenhas” sobre alguns trechos que me interessaram mais de perto e pretendo retomar. A isso somarei mais tarde, obras mais recentes sobre os desdobramentos de suas pesquisas e seu pensamento nos dias atuais.

Ainda, tudo a ser feito!

______.

Livros de Philippa Foot:

FOOT, Philippa. Natural goodness. Clarendon Press, 2003.

______. Moral dilemmas: and other topics in moral philosophy. Oxford University Press, 2003)

______. Virtues and Vices: and other essays in moral philosophy. OUP Oxford; Reprint, 2003).

Informações sobre a a autora: https://pt.wikipedia.org/wiki/Philippa_Foot

_______.

SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS 

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: Nova Cultural, 1987 (col. Os Pensadores).

______. Aristóteles: Ethica Nicomachea - III 9 - IV 15: As virtudes morais. Trad. Marco Zingano. São Paulo: Odysseus Editora, 2008.

ARRIANO FLÁVIO. O Encheirídion. Edição Bilíngue. Tradução do texto grego e notas Aldo Dinucci; Alfredo Julien. Textos e notas de Aldo Dinucci; Alfredo Julien. São Cristóvão. Universidade Federal de Sergipe, 2012).

BORGES, Maria. Borges. Razão e emoção em Kant. Pelotas, RS: Editora e Gráfica Universitária, 2012.

______. Emotion, Reason, and Action in Kant. Bloomsbury Academic, 2019.

CÍCERO. On ends (The Finibus). Tradução de H. Rackham. Harvard: https://www.loebclassics.com, 1914.

COELHO, Humberto Schubert. Genealogia do Espírito. Brasília, DF: 2012.

______. Filosofia perene: o modo espiritualista de pensar. São Paulo: Ed. Didier, 2014.

CUNHA, Bruno. A gênese da ética em Kant. São Paulo: Editora LiberArs, 2017.

______. Autonomy and trust in bioethics. The Gifford Lectures University of Edinburgh, Newnham College. Cambridge University Press, 2002.

______. From principles to practice: normativity and judgement in ethics and politics. Cambridge University Press, 2018.

DESCARTES, R. Oeuvres. Org. C. Adam e P. Tannery. Paris: Vrin, 1996. 11v. [indicadas no texto como Ad & Tan]

_______. Oeuvres et lettres. Org. André Bidoux. Paris: Gallimard, 1953. (Pléiade).

______. Discursos do Método; Meditações metafísicas; Objeções e Respostas; As Paixões da Alma; Cartas. (Introdução de Gilles-Gaston Granger; prefácio e notas de Gerard Lebrun; Trad. de J. Guinsberg), Bento Prado J. 3. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1983 (Os Pensadores).

EPICTÉTE. Entretiens. Livres I, II, III, IV. Trad. Joseph Souilhé. Paris: Les Belles Lettres, 1956.

______. Epictetus Discourses. Trad. Dobbin. Oxford: Clarendon, 2008.

______. O Encheirídion de Epicteto. Trad. Aldo Dinucci; Alfredo Julien. São Cristóvão: EdiUFS, 2012. (Edição Bilíngue).

______. Testemunhos e Fragmentos. Trad. Aldo Dinucci; Alfredo Julien. São Cristóvão: EdiUFS, 2008.

______. The Discourses of Epictetus as reported by Arrian; fragments: Encheiridion. Trad. Oldfather. Harvard: Loeb, 1928.  https://www.loebclassics.com/

GALENO. Aforismos. São Paulo: E. Unifesp, 2010.

______. On the passions and errors of the soul. Translated by Paul W . Harkins with an introduction and interpretation by Walter Riese. Ohio State University Press, 1963.

HADOT, Pierre. The inner citadel: the meditations of Marcus Aurelius. London: Harvard University Press, 2001.

HANH, Thich Nhat. Meditação andando: guia para a paz interior. 21. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.

KANT, Immanuel. Vorlesung über die philosophische Encyclopädie. In: Kant gesalmmelte Schriften, XXIX, Berlin, Akademie, 1980, pp. 8 e 12).

______. Fundamentação da metafísica dos costumes. São Paulo: Discurso editoria: Barcarola, 2009.

______. Observações sobre o sentimento do Belo e do Sublime: Ensaio sobre as doenças mentais. (Trad. Vinícius Figueiredo). Campinas, SP: Ed. Papirus, 19993.

______. Lições de ética. Trad. Bruno Cunha e Charles Fedhaus. São Paulo: Editora Unesp, 2018.

______. Lições sobre a doutrina filosófica da religião. Trad. Bruno Cunha. Petrópolis, RJ: Vozes, 2019.

______. Anthropology from a pragmatic point of view. Carbondale, III: Southern Illinois University Press. 1996. eBook., Base de dados: eBook Collection (EBSCOhost).

______. Antropologia de um ponto de vista pragmático. Trad. Clélia Aparecida Martins. São Paulo: Iluminuras, 2006.

______. Crítica da razão prática. Tradução de Valério Rohden. São Paulo, Martins Fontes, 2002.

______. A metafísica dos costumes. Trad., apresentação e notas de José Lamego. 2. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2011.

KARDEC, A. Le Livre des Esprits. Paris, Dervy-Livres, s.d. (dépôt légal 1985). (O Livro dos Espíritos. Trad. Guillon Ribeiro, ______. O livro dos Espíritos. 93. ed. - 1. reimpressão (edição histórica). Brasília, DF: Feb, 2013a. (Q. 74a “A razão”); Q. 907-912: "paixões"; 893-906: “virtudes e vícios”e 920-933: "felicidade")

LEBRUN, Gérard. O conceito de paixão. In: NOVAES, Adauto (org.). Os sentidos da paixão. São Paulo: Cia. das Letras, 1987.

MARCO AURÉLIO. Meditações. São Paulo: Abril Cultural, 1973. (Livro II. 1).

MASSI, C. D. As leis naturais e a verdadeira felicidade. Curitiba: Kardec Books, 2020.

______. Espírito e matéria: diálogos filosóficos sobre as causas primeiras. Curitiba: Kardec Books, 2020.

NUSSBAUM, Martha C. A fragilidade da bondade: fortuna e ética na tragédia e na filosofia grega. São Paulo, Martins Fontes, 2009. 486 páginas. 

PLATÓN. Carta VII. In: Diálogos VII (Dudosos, Apócrifos, Cartas). Madrid: Gredos, 1992.

RICOUER, Paul. Ser, essência e substância em Platão e Aristóteles. São Paulo: Martins Fontes, 2014.

SÉNECA, Lúcio Aneu. Cartas a Lucílio. 5. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbekian, 2014. (Carta LXXV)

SCHLEIERMACHER, F. D. E. Introdução aos Diálogos de Platão. Belo Horizonte, MG: Ed. UFMG, 2018.

TEIXEIRA, L. Ensaio sobre a Moral de Descartes. Tese (Cátedra) – Faculdade de Filosofia Ciências e Letras. São Paulo, 1955.

ZINGANO, Marco. Aristóteles: tratado da virtude moral. São Paulo: Odysseus Editora, 2008.



Nenhum comentário:

Postar um comentário

CONFERÊNCIA SOBRE ÉTICA, CIÊNCIA E TECNOLOGIA: "CONTRA A PERFEIÇÃO: A ÉTICA NA ERA DA ENGENHARIA GENÉTICA"

Revisitando a estante e aproveitando que, no dia 06 de maio Michael J. Sandel falará sobre o tema tratando no livro acima! E, destacando que...